sábado, 5 de setembro de 2009

É O MITO DO ETERNO

Não adianta tentar entender as razões pelas quais as coisas acontecem. Elas sempre acontecem. Aguardar a mudança no ritmo vertiginoso dos fatos é como buscar o calor no inverno glacial.
Esse mito do eterno retorno ao imaginário primitivo faz com que o belo seja o impulso do grito dado pelo artista em plena construção da sua obra. É o combustível idealizado das forças que sucumbem plenamente pelas falsas insinuações.
A fatalidade e sua forma elástica arrebentam as linhas áureas dos traços infinitos. Transformam a vida num imenso hospital, onde cada doente procura mudar de cama, e trocar suas dores pelas dores daqueles que fazem a visitação.
Os traços sutis que escancaram o desfiladeiro são as marcas das experiências que cerraram meus olhos para o lugar comum. O passeio saudável da imaginação, voltou doente e aflito. A força oculta do que não aconteceu é ainda a maior segurança contra a exposição de uma concepção.
Enquanto tentava acreditar nas esferas sutis das boas sensações, sentei sob o pé plantado da saudade e à sombra da árvore da felicidade degustei os gomos da solidão. Sabor azedo, comparado as expectativas soltas no mundo perfeito das idéias, mas sem meios de formalizar sensivelmente uma possibilidade. Levantei imponente para passear pelas campinas da esperança, e caí pasmo na poça da realidade.
Passei a ser vidente, o presente passei a amá-lo. Prevejo sempre o futuro, desde quando consegui inventá-lo. Assim a vida se constrói dentro das imagens possíveis do que concebo. Nas fossas profundas se destrói a ocasião daquilo que percebo. Reinam flores, reinam animais, frutos mordidos da poesia morta. A lida não se dá com carinhos recebidos, a lida é lida de maneira torta. Na inquietude vasta das coisas que virão, a noite apaga do sol luz do seu clarão. Não percebi a causa poética da fartura, não devolvi o malte que tinha pego. Não perco o rumo das oportunidades refletidas, mas comprometo a taça erguida do sossego.
E quando os olhos pesam sob o cansaço da contemplação, chamo Poe, que se despede da minha mão:
“Santa Maria! Volve o teu olhar tão belo,
de lá dos altos céus, do teu trono sagrado,
para a prece fervente e para o amor singelo
que te oferta, da terra, o filho do pecado.
Se é manhã, meio-dia, ou sombrio poente,
meu hino em teu louvor tens ouvido, Maria!
Sê, pois, comigo, ó Mãe de Deus, eternamente,
quer no bem ou no mal, na dor ou na alegria!
No tempo que passou veloz, brilhante,
quando nunca nuvem qualquer meu céu escureceu,
temeste que me fosse a inconstância empolgando
e guiaste minha alma a ti, para o que é teu.
Hoje, que o temporal do Destino ao Passado
e sobre o meu Presente espessas sombras lança,
fulgure ao menos meu Futuro, iluminado
por ti, pelo que é teu, na mais doce esperança.”

4 comentários:

Anônimo disse...

"Não adianta tentar entender as razões pelas quais as coisas acontecem. Elas sempre acontecem. Aguardar a mudança no ritmo vertiginoso dos fatos é como buscar o calor no inverno glacial."

Novamente fico sem palavras para o teu texto, mas é, as coisas simplesmente acontecem e nada se pode fazer.

Tainara Siqueira disse...

"Não adianta tentar entender as razões pelas quais as coisas acontecem. Elas sempre acontecem..Passei a ser vidente, o presente passei a amá-lo."

Anônimo disse...

Tão diferente de tudo que já li... Achei teu blog e nem ia comentar, mas achei injusto pois o texto é muito profundo.
Não tem como se envolver nesse novelo extenso que é a vida, o novelo se desfaz e as coisas acontecem.

Bruninha disse...

"Levantei imponente para passear pelas campinas da esperança, e caí pasmo na poça da realidade."

Quantas e quantas vezes cai também eu nessa mesma poça na tentativa de entender coisas inexplicáveis sem nunca obter respostas.

Gosto muito daqui, gosto muito de seus textos!
Beijos