terça-feira, 29 de dezembro de 2009

ESSA MERDA TODA


São sinais que ficam na cidade. Numa cidade que se perde dentro das suas próprias convicções de virtude, abandonando a República. São sinais das mãos, que abertas e sangrando lembram o Cristo pregado na cruz. Não o Cristo Deus, e sim o Cristo homem. Exposto aos pecados, riscos, erros, enganos e volúpias.

Peregrinaram pela Galiléia, pela Palestina talvez. Tornaram o confronto das forças audazes o principal objetivo da sua informação. Fizeram milagres, curaram enfermos e cavaram o túmulo que sepultou toda forma de inquietação. São apenas sinais que ficam na cidade. São apenas cidades que se perdem dentro de um só.

A cidade brilha na escuridão criada pela estupidez. Borbulhas gotas de luz, temperadas pelo amargo sabor daquilo que se prova e se rejeita. As luzes refletem a abóboda celeste. São elas a própria abóboda encantada, simulando um reflexo de si.

Iluminam o templo construído pelo grande arquiteto. Nessas noites de indagações, minha resposta é única resposta que concilio com meu bem estar! O meu templo é o único corpo seguro para rezar. Elevo aos céus humilde prece, enquanto o frágil som ecoa pelo ar. Elevo aos homens suas benecies. Espero o trem que vai me levar.

A Estela que Hamurabi deixou escrita, poderia muito bem percorrer o tempo, viajar pelo universo paralelo e infinito. Quem sabe era ela a pedra negra da Odisséia de Kubrick? Ou talvez fosse ela a pedra usada pelos primeiros primatas na busca pelo fogo que aqueceu, ardeu e queimou as primeiras folhas do despertar da humanidade.

A Cruz permanecia elevada, mesmo com as pedras que rolavam pela montanha. Os peregrinos desavisados, escorregavam pelo caminho íngrime. Caiam, despedaçando seus corpos, que nunca acumularam mais do que poeira e água suja. Deixavam seus pertences aos cuidadosos guardas da estrada. Muitos não levavam vinho, não traziam óleo, mas tentavam se candidatar ao posto de guardiões da saúde espiritual.

Saúde espiritual?

O corpo precisa de alívio.

A alma precisa de conforto.

O corpo precisa de abrigo.

A alma jaz num ponto morto.

Anjos, principados e potestades anunciam o dia do Juízo Final. Preparem as pedras! Preparem a lista do julgamento que se escreve sob o júdice de quem proferiu a última sentença.

Indecisos jurados sentarão diante do trono. Réus ignorantes se afundarão nas suas declarações. Será dado o veredicto! Será dado o veredicto!

Acima de todas as infâmias praticadas pelos mortais, estarão os sonhos alados da humanidade. Serão contados os segredos dos deuses, aos próprios deuses generais.

sábado, 19 de dezembro de 2009

A PEQUENA TORRE DO MEU GIGANTESCO CASTELO


Ver seu rosto transforma o meu dia. A brisa que sinto todas as manhãs, transforma-se em ventania quando olho pra você. Meu coração que no compasso certeiro das batidas escreve sua lida, desconcerta-se diante da sua imagem, acelera como um louco procurando as cores e os sabores para te conquistar.

Imaginar você é uma maneira de trazê-la para perto de mim. Imaginar você é ter a certeza de que a nossa realidade é muito mais perfeita que a nossa imaginação. Vejo você nos sonhos, mas não toco sua pele, não sinto o seu rosto. Quando estou ao seu lado, toco seu corpo, e vivo num constante sonho. Por isso, com você, minha realidade é mais completa do que as minhas fantasias.

Sentir seu gosto enche minha vida e preenche minha boca. Deve ser por isso que quando estou contigo minhas palavras somem. Não sou quieto, sou tagarela, mas mesmo esse ser falante se dobra diante do não saber expressar através de frases quão maravilhoso é estar ao seu lado.

Seus lábios são a energia que preciso para desvendar os mistérios do seu sentimento. Seus olhos são as janelas nas quais me deleito, debruçado a noite e vendo o céu. No céu estrelas brilham intensamente. Há anos luz que milhares de pontos celebram seu calor. Não sei quando começaram nem quando se apagarão, por isso digo que são eternas.

Quando se sentir sozinha, olhe para a imensidão do universo. Busque um ponto no qual fixar o olhar, e saiba, que onde eu estiver, sentirei seu apelo de carinho. Virei correndo ao seu pensamento e entrarei no seu coração. Agradeço aos meus pés que um dia mudaram a direção da minha vida e me trouxeram até você. Sempre estarei aqui para que você possa encostar a sua cabeça e expressar as dúvidas inquietas da sua alma. Quando eu estiver contigo, mesmo que em pensamento e em regra de saudade, sentirá uma mão quente fazendo pulsar seu peito. Essa mão será sua mão protetora sempre que precisar. E ela sempre estará para você.

Em cada estrela busque um beijo meu, e em cada beijo encontre um pouco do meu amor. Não tente encontrá-lo por completo, pois nem eu ainda o achei. Todos os dias encontro um pedaço dele, que se junta com outros pedaços e não me deixa ver o seu fim. Ele não tem fim. Ele não cabe em apenas três dimensões.

No mar milhares de gotas preenchem aquilo que um dia foi um imenso vazio. Em cada gota um pingo de suor, em cada pingo de suor um pouco de mim, em cada pouco de mim, um pouco de você, em cada pouco de você um pouco de nós. Sabemos o que queremos e sabemos como pedir.

Você é o espelho que resplandece minha face. Você é o eco das minhas palavras de amor. Eu sou o espelho que resplandece sua face. Eu sou o eco das suas palavras de amor. Agora não me pergunte quem é o original de quem. Me perdi em você quando encontrei você perdida em mim. Nunca tive esse rosto. Meu rosto era frio. Você foi o calor que varreu para longe o inverno da minha face. Nunca tive essa esperança. Mas nos sulcos das minhas lembranças, você encontrou uma fonte que fez a água verter das rochas.

Quando penso em você, um turbilhão de lembranças visita minha cabeça. Quando penso em você me sinto forte e invencível. Poderia dizer que fico pronto para enfrentar o mundo. Tento nessas horas apenas superar a imensa saudade que arrasa meu coração, mas que me presenteia com a sua chegada também. São as doces lembranças que tenho de você.

Fico me recordando dos momentos em que o nosso amor, o nosso carinho, a nossa paixão, o nosso fogo ardente e permanente se conjuga em uma só pessoa: Nós. Posso conhecer teorias, posso ser inteligente, posso ter informação, mas quando minha alma tocou a sua alma, eu era apenas uma alma humana buscando a sensação divina do amor. Você é a parte que faltava para completar meu ser inteiro. Você é aquela que me falta quando estou longe, e penso logo numa forma de voltar ligeiro. Você é o anjo que ao me tocar, provoca em mim as sensações que só os demônios provocariam. Quero arder com você nos lençóis celestiais.

É através desse sentimento, a saudade, que encontro os meios para sobreviver quando estou distante de você. Ela é o alimento para esse sentimento que chamamos de amor, mas que nos surpreende todos os dias com sua falta de definição.

A longa distância por vezes estabalecida, serve para unir os nossos corações, e eu volto a exaltar a saudade, que serve nessas horas como certeza de que ficaremos para sempre juntos. Não sei se a vida será curta ou longa para nós, mas descobri que ela somente terá sentido seu eu puder senti-la junto com você.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

LOST SITUADO



Cala a sua boca. Afaste-se de mim com suas verdades mentirosas, concluídas na tentativa frustrada de querer ser alguém. Reflita somente em si suas partículas coloridas de ignorância monocromática e procure impressionar aqueles para quem você ainda é alguma coisa, antes que eles percebam a mentira que há sobre você.

Não presto atenção nas suas palavras, pois suas repreensões são falsas, e suas frases soam nojentas aos meus ouvidos. Elas querem dizer no final que nunca disseram nada no seu contexto. Seus conselhos são uma comida venenosa. Aparentemente apetitosos, mas no íntimo querem destruir minha vida.

Não queria que a vida tivesse chegado nesse ponto. Não queria ver em você a poção decadente do boticário, mas quando ouço o seu caminhar, sei que o barulho dos seus passos me atormenta. Não é por medo, afnal não tenho medo de você, tenho desprezo por você. Nem tampouco por receio, mas pela simples sensação de ver você. Seu dom de estragar meu dia, ganha cada vez mais uma força real.

O heroísmo e o herói dos erros inexistentes que algum dia estiveram em você, ficaram abandonados em alguma mentira que ouvi da sua boca. A imagem infalível de alguém que me ama, foi sufocada pelo cheiro etílico dos seus lábios. Sua desconcertante trajetória me fez repudiar tudo que um dia sonhei cativar por você.

Não queira abraçar aquilo que seus braços abandonaram. Não queira entender aquilo que sua cabeça dispensou. Não queira se aproximar da distância criada em torno das desilusões pelas quais passei. Seu discurso procura me afastar da sua realidade, suas palavras apenas querem transformar meu delírio juvenil, num pecado de vontade.

Hoje resolve me procurar pelas ruas dirigindo o que acha ser a sua vida, sem saber ou notar, que por anos estive bem ao seu lado. Você podia me ver, mas percebo que nem ao menos quis me olhar.

Brincava de família, brincava no sofá, brincava com as ilusões que eu criei para tentar sorrir. Para me ver era só abrir os olhos, mas talvez os rótulos e as falsas impressões do mundo, ocultaram de você a minha imagem presente.

Quer me controlar como a uma criança. Quer mandar na minha vida, como se ela fosse um jogo controlado pela sua vontade. Essa imagem de criança, é a última imagem que tem em sua cabeça. Você não me viu crescer, e por isso acha que ainda pode estender sua mão protetora, que na verdade, lembra a mão de um algóz querendo me prender.

Você me sufoca em todos os lugares e em tudo o que faz, alegando fazer o bem. Quer se achar o bom e se fazer de bom, quando não passa de alguém que já fez tudo o que podia na vida, e acha que as pessoas ao redor farão igual. Ou seja, acha que o mundo será para mim uma projeção daquilo que você viveu. Imagina que a falta de respeito desregrada que as pessoas cultivaram ao longo do tempo e que você viu como combustível para suas ações, será a precursora das minhas vontades.

Saiba que sou muito mais do que essa imagem. Saiba que vivi um mundo inteiro longe de você. Saiba que minha alegria está na sua ausência, e minha sabedoria habita na minha independência. Grito, choro, corro, vivo. Tudo isso eu faço sem você saber. Você nunca quis saber, você nunca iria entender. Colha agora os frutos da sua ignorância, e perceba que nos momentos eternos da infância você começou a me perder.

Você deixou de me fazer bem. Agora porém, encontrei um encosto para minha cabeça. Encontrei um repouso para os meus olhos, encontrei parada para o meu coração. Queria dividir isso com você, mas as circunstâncias da vida tornaram nossa convivência impossível. Seu exemplo deixou de ser exemplar quando suas ações não podiam mais ser seguidas.

Não serei a pessoa que você espera, serei alguém que irá muito mais além do que você supõe. Aprenda a me conhecer, talvez assim não ficará surpreso com a minha vitória, talvez assim aprenda a ler um pouco mais sobre a minha história. Ela tem sido escrita num monólogo permanente, mas há algum tempo que tem encontrado alguém para escutar. O que antes era apenas uma suposição, agora é uma verdade escrita nas tábuas que eu quero que sejam eternas. Eu serei feliz amando, você será um corpo esquecido nas tabernas.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

ACABOU O PAPEL


Vamos fugir para um mundo onde os sonhos se completem a cada instante. Um mundo feito de poucos dias, feito de fadas e magias. Um mundo de águas e de alegrias. Sem despedida de boa noite, com o gosto constante de um bom dia.

Onde o silêncio não cultiva lágrimas e onde o inferno é apenas um lugar perdido nos livros e nos filmes. Onde possamos viajar antes de dormir, e imaginar um céu límpido no momento do amanhecer. Sem ser preciso imaginar que palavras dizer ao acordar, e não se preocupar com a angústia na hora de se despedir.

Um mundo construído em cada minuto vivido. Sem esonderijos para as emoços, e sem atitudes que revelem falas interpretações. O verdadeiro mundo do entendimento, do cuidado, e das palavras certas que não causem arrependimento. Um mundo feito para ser guardado pelos eterno universo infinito.

Guardo suas palavras, e como um tesouro num relicário, guardo sua forma de olhar. Guardo você nos meus pensamentos e concluo em cada lembrança que você é especial, você é cósmica, você é espacial. Vive num espaço que não controlo, mas faço existir. Dentro das sementes ardentes da alma, que buscam uma terra fértil para brotar, eu crio um mundo que é só meu, e que aguarda o instante exato para germinar.

Queria que viesse comigo para esse mundo mágico, que se abre exatamente no instante que meus olhos se fecham. Um mundo da imaginação, do pensamento, dos sonhos. Como não consigo deixar de sonhar e como não consigo me desfazer da minha cabeça, constantemente estou visitando essa minha atlântida perdida. Pode ser platônica, pode até ser loucura, mas experimento a verdadeira realidade quando fecho os meus olhos para vê-la.

Siga adiante essa história. Consolide em versos os sonhos. Em poesia, os versos. Em história, as poesias, e em ações, as histórias. E numa vida repleta de vigor, escreva outras histórias, outras poesias, outros versos e outras sensações.

Já viajamos no tempo. Já estivemos presos nas cavernas iluminadas pelo fogo. Já sentamos nas casas das vilas romanas. Já fomos cavaleiros nas eras medievais. Já empunhei uma espada, reluzindo sua lâmina pelas campinas da europa, enquanto você me aguardava em nossa casa, esperando pelo retorno do nobre lutador. Já estivemos em outras cabeças, e foi na nossa história que o teatrólogo Shakespeare obteve inspiração para Romeu e Julieta.

Já viajamos os espaço do tempo, como uma ideia de amor. Já paramos à beira da estrada para ver a água que cortava a rocha, e que cantava com suavidade infantil, uma música que nos estimulava a continuar. A partir desse momento, o mundo passou a refletir o céu.

A vida poderá ser um abismo, a vida poderá ser um campo cheio de energia. A vida poderá ser um mistério dentro da sua forma de contemplação. Não quero que a vida seja porém, uma possibilidade de viver, uma praga chamada razão. Quero que o frio do medo me acompanhe e seja vencido pelo calor, que apenas a possibilidade do seu abraço, pode me dar.

sábado, 28 de novembro de 2009

O ALTO ME ESPERA


Os olhos não conseguiram conter o espaço do mundo. Não seguraram a tranquilidade de um destino traçado pela inquietude do conformismo. Esses olhos que conversam com os meus, sempre estiveram distantes de um encontro solitário consigo mesmo. Agora contudo, não queriam ficar em silêncio, não queriam passar despercebidos pela chance de se mostrarem verdadeiros e conquistados.


Gritaram! Gritaram com seu brilho que resgatou um coração blindado e refletiram as águas de um lago esquecido, mostrando assim que dentro da geleira existia vida. A vida apaixonada pela vida. A vida apaixonada pelo sorriso que levemente solta as gargalhadas demonstrando que o querer bem sempre quer estar ao nosso lado. A vida que soltou seus pensamentos das amarras amargas dos anos de preocupação e deu a eles a liberdade incondicional de sonhar.

Essa liberdade do impossível, do improvável, do desconhecido e até mesmo do desacreditado.

Escrever na pedra corpórea da poesia pura os sinais que serviriam para retomar a esperança de respirar sorrindo. As letras cravadas nas entranhas da pele, penetraram tão fundo, que o calor emitido pela carne ardente era semelhante ao magma terrestre em movimento, causando terremotos e pronto para entrar em erupção, expressando assim as intenções de uma alma que arde, mas arde distante do inferno. Uma alma que alcançou a vontade de estar no céu, mesmo que seja para se esconder daqueles que a conhecem, e desfrutar assim de uma eternidade de sensações absurdas e até pecaminosas para os planos divinos. Até Deus, entretanto, entenderia que as penitências são o subterfúgio para a falta de felicidade.


Seus sonhos foram maiores do que sua dúvida e sua capacidade de acreditar no que parecia impossível permitiu que as letras do universo encantado fossem transformadas no som cheiroso de um toque sedutor. As sílabas foram divididas com o peito, que pulsando tão forte como sua decisão, acelerava o compasso da coragem, e dizia bem alto, que vale a pena seguir em frente.

Recebi seus presentes. Vi você deitada respirando paixão, respirando a fúria da pele. Senti sua presença quando o vento brindava a noite quente, e a televisão era desligada com a companhia de um beijo. Nosso champagne ainda aguarda fechado na geladeira. As portas da vida ainda aguardam o encontro leve das mãos que abrirão um caminho de possibilidades.


Nada mais seria demais, nenhum outro momento seria preciso para destacar a força da sua respiração e a capacidade do seu olhar. Mesmo que tentassem, minhas mãos poderiam apenas acariciar seus cabelos, mas não ocupar sua cabeça. Poderiam tocar seu rosto, mas jamais invadiriam seu olhar. Poderiam até mesmo sentir a maciez da sua boca, mas jamais conseguiriam provar o sabor secreto de um beijo seu. Sendo assim restou aguardar a ocasião propícia do momento inesperado. Um momento que passou a existir quando a garganta arranhou as primeiras palavras de aproximação e ensaiou a cena de um reencontro cordial e eterno.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

NA CASA ONDE ESTAVA SOZINHA



O dia se separa da noite com beijos de despedida ao amanhecer. Ele dá seu adeus de forma singela, quase discreta, forçando inclusive uma maneira certa de não aparecer. Esconder nas entranhas dos raios da manhã, todos os segredos cultuados pelos espectros dos sentimentos noturnos. São as coisas que precisam ser escondidas que escrevem boa parte das nossas vidas.

Piedade dos céus para todos os santos sem amor. Piedade para as línguas que se preocupam com o gosto das nossas aventuras. Que essas línguas queimem sob o peso da infelicidade, já que pertencem a corpos insanos, tão insatisfeitos consigo que não se preocupam em dizer coisas sobre a própria vida, antes olham a vida daqueles que lhe atraem, justamente por viverem da maneira mais descabida para essas cabecinhas animais.

A baixaria é o alto da existência, quando ela está de cabeça pra baixo, beijando flores em vasos rasos e sequestrando soldados fracos nas trincheiras condenadas pela morte certa. A separação das estrelas de sua luz e a força da bomba sem a explosão me fizeram acreditar que o ridículo das frases prontas está na intensa reflexão das palavras de adeus. Eu não conheço a morte, não me preocupo com as ações alheias. Não me interessa para onde vão as pessoas, e nem quem seus braços apoiaram como consolação de uma tentativa ligeira. Minha preocupação é o que fazer com a imortalidade do meu sentimento.

Ele abocanha letras, invade páginas. Ele distancia as notas das canções simples, para transformá-las em melodias complexas, tocadas sob a inspiração de um verdadeiro coração apaixonado. Qualquer acorde se transforma numa sinfonia, e qualquer letra vira sob a ideia do amor, uma límpida e aparada poesia. Minha sensibilidade extravasa os limites das minhas regras. Procuro entender a origem do medo, a origem da angústia.

Enlouqueço meus pensamentos e entorpeço meus sonhos para tentar descobrir quem sou e saber onde estou. É nessa procura desenfreada pelas sensações múltiplas das oportunidades que encontro o desejo intenso de querer que a vida me leve para onde eu nunca poderei levá-la. Que ela me conduza em passos decididos para o labirinto dos beijos aquecidos. Beijos de uma parede apenas. Beijos de um corpo escolhido. Beijos diferentes de uma única fonte: A sua boca!

A solidão será abandonada, e o século buscará outra praga para celebrar.

Quero contar minhas besteiras em clássicos que ocupem as prateleiras dos pensamentos simples e os enriqueça com a saudade do silêncio noturno.

Quero viver o luxo e o lixo da vida. Encontrar a paisagem oculta nas formas opacas de um quadro em grafite. Acostumar-me ao prazer das suas mãos escrevendo meus dias. Quero provar o reencontro em cada véu de despedida. Quero abraçar a saudade no momento da chegada e guardar seu cheiro aceso na lareira da invernada. Não quero que você veja meu passado, quero em você meu ponto de partida! Quando notei que a maior presença nos meus pensamentos era a sua ausência, percebi que somente contigo meu corpo encontraria paz.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

UM ANJO NO CORPO DE MULHER


Tudo são cores nesse imenso mar das coisas sagradas que a vida nos oferece. O turbilhão das ondas deixa um leve resquício de desespero que nos leva pro céu. Homens alados brigam pelo espaço junto à mesa dos deuses. O destino joga cartas, e parece que pela primeira vez ele deixou de me perseguir.


Colori com pincel de tinta celeste a carne que cobre meus ossos, dei-lhe uma cor de vida, e permiti que ele respirasse pela primeira vez, acreditando que existe uma experiência nova e latente em cada tonalidade vertida. Finalmente sinto como é bom descansar meu corpo. Abandonar a senda solitárias das companhias ligeiras, fincando em terra firme a âncora da minha poesia.


Provei o laranja da água quente, o verde da tarde nublada, provei o azul do céu reluzente e o vento escuro da noite estrelada.


Provei o vermelho do lápis em carta, o roxo da fantasia laureada, o preto do quarto das luzes e a menina que visitou a mesa das flores durante a madrugada.


Ontem quis tomar conta de mim, e hoje vejo que não consigo dar um passo na direção da minha certeza. Perdi a noção das minhas regras e descartei aquela forma opaca da minha rudeza. Eu pensei que podia brincar com o mundo, e percebi que o mundo brincou de exagero comigo desprezando o abrigo de toda a minha destreza.


Trago sempre minhas asas, não as abandono, pois sei que posso voar bem mais alto que o céu, toda vez que eu desejar, basta trazê-la comigo, basta levá-la pra viajar. Não precisei visitar o paraíso para descobrir a felicidade, não precisei mais do mundo para encontrar a lealdade. Não morri e mesmo assim tornei-me um anjo, descobrindo de onde os sonhos vêm. Eles vêm da quietude cultivada de um sentimento verdadeiro. Eles trazem a calma buscada de cultivar os beijos certeiros. Mantém os pés aquecidos sob os lençóis, que escondidos celebram a paisagem do tempo primeiro.


Visitei seus olhos como um viajante despreocupado, deixei minhas malas num canto livre e desavisado. Nesse instante percebi que a lua se despedia, sumindo por detrás do horizonte. Lá escurecia para mais uma noite de inquietudes, e aqui amanhecia, numa manhã onde os raios do sol escorriam pelos telhados, fazendo-nos esquecer de tudo que já existiu e elevando nosso fôlego ao mais ansioso dos momentos: O que está por acontecer!


Procurei sonolento pelo seu corpo que dormia. Encontrei em você as horas que entraram em sintonia. Tirei o relógio que não suportaria a água, e deixei que as minhas mãos tocassem a verdade dos seus sentimentos. Ocupei a madrugada com o silêncio rompido e viajei para o nosso reino com o peito despido. Deixei minha armadura nas mãos da sua doçura. Abandonei minha espada nas formas quentes da sua figura. De cavaleiro desajustado, me fiz escudeiro fiel. Abandonei os doces amargos roubados para provar o verdadeiro gosto do mel. Quando a boca sedenta pediu outra vez o beijo seu, percebi que muitas viagens me fariam voltar ao céu.


Todo instante uma surpresa, e em toda surpresa o prazer de poder acordar. Acordo nos dias misteriosos para ter a certeza de que o maior dos mistérios se curva diante do abraço sincero e das palavras que verdadeiramente sabem o que dizer.


Veleiro de cristal nas águas calmas de uma vida que começa. Abrace-me com toda a força, e sinta o vento dos navegantes sonhadores, que sai do meu peito, recolhe nossos amores, e impulsiona o barco, que a toda velocidade ruma para o poente.


Veleiro de cristal, brilha as memórias confiadas, reluz a forma bela dos seus traços, transformando os sonhos na realidade de ter você aqui sem notas ensaiadas. Nossa música eleva ao sublime tudo aquilo que gostaríamos de dizer, nossa música é mais do que a música que o mundo inteiro poderia ler. Cantar é como dizer quantos sonhos coleciono quando penso em você.


Insuspeita desavisada da cor da vida. Poderia haver luz maior que a do sol? Poderia algum perfume, perfumar mais que o cheiro suave das flores? As rosas brancas, as rosas vermelhas, são elas as mensageiras daquilo que o coração não estava próximo para dizer. O fogo dos seus lábios serve para mostrar que não existem perguntas e nem respostas certas para um sentimento novo por inteiro.


Podemos ver longe, muito longe nesses dias tão brilhantes que a realidade com gosto de fantasia escreveu. Hoje é mais um instante pra lembrar que hoje eu quero esquecer. Deixar tudo pra amanhã, e o que eu tinha pra fazer vai ficar pra depois. Agora quero que você deite no meu colo e ouça a batida viva do meu coração.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Monalisa você tá rindo de mim?




Minha cabeça é uma armadilha que espera a oportunidade para atacar e tentar destruir com a chuva o dia que o sol elevou.
Ela consegue turvar o céu límpido e margeado pelos lábios de um sorriso sincero, transformando em dentes que se mostram, a água que banha minhas costas feridas.

Minha cabeça conta histórias que não existem e repassa o texto, abandonado justamente por não trazer bem algum. Jogo fora todas as inquietações. Essa cabeça tola no entanto, como um entregador atrasado, corre para o meu encontro, trazendo dentro de si todos os dejetos rejeitados.

Fico perdido no emaranhado de suposições e pensamentos. Não presto atenção naquilo que me rodeia, e despeço sem saber, a oportunidade do sentimento.
Olha-me em silêncio. Fita minha aflição. Pergunta em silêncio o motivo da minha inquietação.

Deixei seus cabelos livres, olhei para o nada da porta aberta. Poderia tê-la prendido entre meus dedos, e olhado em seus olhos, os cristais de Cinderela. Vislumbrei o teto, vislumbrei o nublado. Vislumbrei cada centímetro perdido, cada toque consolado.

Dentro do universo das possibilidades e pensamentos, eu sempre procuro aquele que me consome, aquele que me machuca. Entrego meus instantes condenados ao carteiro, que guarda todas as minhas letras em cartas impronunciáveis.

Procuro aquele que me fará sofrer, procuro aquele que me lançará no poço profundo. Somente nesse instante sinto que me protejo. Somente nesse instante sinto que não fujo.

A constante e inevitável tentativa de proteção! Proteger meus passos das pegadas que eu mesmo dei. Proteger a minha estrada da estrada minha, que um dia criei. Abandonei seus traços, abandonei o seu caminho, e pela primeira vez nessa viagem, senti medo de estar sozinho.

Proteger-me de mim mesmo, como se eu fosse um canibal faminto, sangrando pelo corpo inteiro, tendo a mim como única alternativa de sobrevivência. Devorar minha felicidade, devorar meu bem estar. Devorar o sorriso, pelo medo dele se converter em lágrima num dia que pode nem existir.
Sofro pelas ideias que minha cabeça cria,

sofro pelas pessoas que essas ideias fazem sofrer.

Não queria nenhuma cena tétrica na minha poesia.

Não queria nenhuma dissonância na minha harmonia.

As nuvens carregadas, porém, não respeitam o desejo de um pedinte. Desprezam a falta do tempo, e descartam a impossíbilidade imediata de um encontro.

Assim agem, para poder construir suas ciladas.

Caio nelas, como se fosse um desavisado menino, se encontrando com a primeira provação.

A salvação foi anunciada pelo evangelho escrito. Lido num banheiro, lido num quarto. Lido tantas vezes que as palavras puderam ficar gravadas nas impressões digitais de pequenas mãos, grandes o suficiente para envolver o universal comprovado dos sonhos que o sono não pode acordar.
Espero um sorriso, espero palavras, espero um cuidado. Espero a sensação boa invadir meu corpo, expulsar as indagações idiotas e encontrar a permissão para sorrir. Com a áurea aflição incondicional e livre.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

OS ETERNOS 5 MINUTOS...

Olha a noite solitária que ilumina o arrebol encantado que o firmamento preparou. Ela esconde tantos segredos, ela guarda um caderno cheio de desejos que o coração escreveu, que o menino inventou.
O céu joga sobre seus ombros uma luz forte e a lua mostra seu esplendor. Deixa presa a mão da sorte, solta os pés do seu admirador. Olha a lua, e veja meus olhos refletidos na imagem iluminada dando boa noite com beijos de viagem. Ela saiu do seu esconderijo para ver você, e viajaria na cauda de um cometa se você pudesse esperá-la mais uma vez.
Sinta o toque sereno dos meus lábios, e saiba que mesmo quando está com os olhos fechados eu abraço seu olhar. Mesmo quando nega sua tristeza, eu insisto em procurar. Quero ter a certeza de ter feito tudo para secar as lágrimas que seus olhos quiseram derramar. Não diga que não tem nada. Abrace-me e procure meus ombros, eles sempre estão preparados para acolher você.
Veja a tarde. Tarde dos testemunhos sinceros sob o céu nublado. Lança o vento sobre seus cabelos, protege suas asas. Asas de um Anjo que cuido com o prazer do meu tempo. Anjo que solta os cabelos, e os deixa como reféns do vento. Os cabelos ocultaram seus olhos e me fizeram admirar com paixão cada medo do seu coração.
Anjo que dorme ao meu lado. Anjo que levo no peito como um escapulário de santos prateados. Conheço seus mistérios e conheço o cheiro novo de um minuto em cada instante eternizado. Conheço seu sorriso que brilha em torno de cada novo despertar. Conheço sua boca que muda cada vez que pensa no que está falado. Conheço suas manias, que hoje em dia copio mesmo sem pensar.
Poderia descrevê-la apenas com a minha memória. Compor uma música com suas palavras mesmo que não as dissesse outra vez. Poderia recriar cada centímetro do seu corpo. Dizer a dimensão, explicar a textura, relatar o tom, e guardar só para mim o gosto da sua pele. Só não peça para contar-lhe meu primeiro desejo. Poderia contar-lhe todos os outros, do segundo ao último que se reescreve a todo instante. O primeiro, contudo, eu teria de guardar. Preciso respirar para contar-lhe tudo, preciso dormir para sonhar outra vez. Estou sem sono agora e fiquei sem ar há pouco.
Ouço cada toque das suas mãos quando meu rosto se encaixa entre seus dedos. Ouvi uma bela canção quando escutei seu coração batendo dentro do meu peito. Prometi dar-lhe as estrelas em uma visão, e prometi busca-la à noite em oração.
Dormindo sonhei, e sonhando percebi que estava sorrindo pela madrugada. Um sonho que trouxe os presentes que nunca recebi. Um sonho que trouxe você para perto de mim. Descobri que as cores têm cheiro, que os sabores têm sons. Que os sentidos se misturam e que chuva é um tempo bom.
Há muito não sei o que é caminhar pela terra, há muito descobri que existe um espaço eterno para conhecer. Os olhos se perdem dentro de um infinito de coisas e a boca beija as palavras antes dizer que eu preciso dizer.
Durmo tarde todos os dias pensando nas orações que farei. Escondo os pedidos que tenho dentro do meu peito, com vergonha de mostrá-los a alguém. Já chorei, já sorri, já abracei, já me despedi. E hoje anseio assistir a rainha recebendo uma pedra do seu reino.
Sempre tive curiosidade de conhecer o inferno, e arrumei companhia para a viagem. Sempre tive curiosidade de conhecer o céu, e sei que ele poderia se tornar o melhor lugar para passar a eternidade. As pequenas coisas que conheço me fazem conhecer melhor.
Sozinho adormeço outra vez, nessa quietude que o silêncio traz. Estou certo porém, de que quando acordar, meu toque despertará você.


terça-feira, 29 de setembro de 2009

EU PRECISO DIZER...

Agora sai toda a esperança que existe e a autenticidade da vida se reduz a uma cópia de nós mesmos, já que a velhice é apenas uma paródia da vida.
Quando se aprende a viver?
Quando se descobre o sabor contido em cada minuto. Quando se resgata a sensação do tempo que passa veloz como um pensamento, e encerra um dia quando as sensações deixavam o imaginário e tomavam sua forma real.
Gotas festejam o tempo das chuvas. Lugares novos se tornam a expressão do desconhecido. Brilha a velha mobília e aguarda pelas novas paisagens. É a nova estação que chegou. É a resistência curvada diante da vontade. Não pude deixar de colher as uvas, entreguei o gosto daquilo que deixou.
Restou um cheiro que me acompanha enquanto durmo. Visita meu rosto através das cortinas, como os primeiros raios de sol, num dia sem nuvens estampando um céu azul.
Restou o cheiro que verdadeiramente me desperta ao acordar. Suavemente, com suas mãos espalha as marcas das minhas costas, e tal qual a tinta numa tela, expõe os relances do pensamento. Os pingos coloridos perseguem os caminhos do meio, no meio turno. Entendem que o tempo busca um travesseiro para reclinar. Busca no calor, as linhas intensas para escrever.
Palavras que as arvores entenderam bem. Testemunhas da confissão que não é pecado. Ouvem o concerto sincero da melodia, que sob o silêncio quebrado, expressa aquilo que a quietude não soube dizer, ou julgou não bastar.
Fazem música nas noites quentes e poesia nas tardes frias. Celebram o canteiro plantado sob a certeza da descoberta de uma fonte de sorrisos.
Fruta de sabor indescritível que amadureceu lentamente, e despertou à sede da saliva. Entrega-se como fada ao mundo mágico do paraíso, e busca com seus doces desejos recriar o passo encantado.
Quando sentei na pedra e pensei na música eterna, percebi que todas as músicas entravam para o tempo sem fim. Tentei ser carregado nos braços e cai na relva, só me senti seguro injetando seu beijo em mim.
Dei as costas ao céu nublado, e percebi nos olhos que brilhavam o reflexo da minha face rubra. Preferi ser culpado por minhas palavras do que ser condenado, pelo meu silêncio.
Já escrevi sobre silêncios e noites. É solitário demais. Previ a angústia do inexprimível. Contei as letras da ousadia, e deitei na cama das chamas ardentes e infernais. Atormentado pela inquietude daquilo que não pude explicar, e preso pela chance de uma fuga, usando o caminho que sempre me deixava no mesmo lugar, percebi que a vida não repete os sinais, e nos oportuniza uma chance para aproveitar.
Cansei de saber que o que eu mais queria era sempre saber mais. Percebi que a visão é a constatação autêntica da cegueira, já que ela nos limita ao campo possível dos sentidos. Não consegui estar pronto quando a hora chegou, e até hoje procuro o ponteiro que deixou meu relógio completamente perdido nesse tempo louco.
Já esqueci as chaves, já esqueci os óculos, já me senti vazio. Um dia achei que havia acreditado num outro conto vão, mas despertei pelas palavras que soaram sinceras mais uma vez. Acreditei. Acima das minhas inquietudes, habita um desejo de fazer acontecer. Acima do medo, subiu a vontade de poder dizer. Disse. Falei aos ventos que levaram minha mensagem ao coro celeste. Ouvi então os acordes que vinham de além mar, e encontravam as almas no sopro santo do espírito sincero. Desarmei meu corpo diante do pedido que minha alma me fez, e fiquei exposto aguardando um sorriso.
A estrela chorou o brilho do céu na voz vermelha
O infinito rolou solto nas duchas do chafariz
Seus olhos captaram a intensidade da centelhaFogueira e chama ardente envolvendo seus quadris

sábado, 5 de setembro de 2009

É O MITO DO ETERNO

Não adianta tentar entender as razões pelas quais as coisas acontecem. Elas sempre acontecem. Aguardar a mudança no ritmo vertiginoso dos fatos é como buscar o calor no inverno glacial.
Esse mito do eterno retorno ao imaginário primitivo faz com que o belo seja o impulso do grito dado pelo artista em plena construção da sua obra. É o combustível idealizado das forças que sucumbem plenamente pelas falsas insinuações.
A fatalidade e sua forma elástica arrebentam as linhas áureas dos traços infinitos. Transformam a vida num imenso hospital, onde cada doente procura mudar de cama, e trocar suas dores pelas dores daqueles que fazem a visitação.
Os traços sutis que escancaram o desfiladeiro são as marcas das experiências que cerraram meus olhos para o lugar comum. O passeio saudável da imaginação, voltou doente e aflito. A força oculta do que não aconteceu é ainda a maior segurança contra a exposição de uma concepção.
Enquanto tentava acreditar nas esferas sutis das boas sensações, sentei sob o pé plantado da saudade e à sombra da árvore da felicidade degustei os gomos da solidão. Sabor azedo, comparado as expectativas soltas no mundo perfeito das idéias, mas sem meios de formalizar sensivelmente uma possibilidade. Levantei imponente para passear pelas campinas da esperança, e caí pasmo na poça da realidade.
Passei a ser vidente, o presente passei a amá-lo. Prevejo sempre o futuro, desde quando consegui inventá-lo. Assim a vida se constrói dentro das imagens possíveis do que concebo. Nas fossas profundas se destrói a ocasião daquilo que percebo. Reinam flores, reinam animais, frutos mordidos da poesia morta. A lida não se dá com carinhos recebidos, a lida é lida de maneira torta. Na inquietude vasta das coisas que virão, a noite apaga do sol luz do seu clarão. Não percebi a causa poética da fartura, não devolvi o malte que tinha pego. Não perco o rumo das oportunidades refletidas, mas comprometo a taça erguida do sossego.
E quando os olhos pesam sob o cansaço da contemplação, chamo Poe, que se despede da minha mão:
“Santa Maria! Volve o teu olhar tão belo,
de lá dos altos céus, do teu trono sagrado,
para a prece fervente e para o amor singelo
que te oferta, da terra, o filho do pecado.
Se é manhã, meio-dia, ou sombrio poente,
meu hino em teu louvor tens ouvido, Maria!
Sê, pois, comigo, ó Mãe de Deus, eternamente,
quer no bem ou no mal, na dor ou na alegria!
No tempo que passou veloz, brilhante,
quando nunca nuvem qualquer meu céu escureceu,
temeste que me fosse a inconstância empolgando
e guiaste minha alma a ti, para o que é teu.
Hoje, que o temporal do Destino ao Passado
e sobre o meu Presente espessas sombras lança,
fulgure ao menos meu Futuro, iluminado
por ti, pelo que é teu, na mais doce esperança.”

domingo, 23 de agosto de 2009

JÁ ESTAVA NA HORA DE MUDAR

Entre quatro paredes de ferro e vidro escrevi partes do meu destino. Expus no leito reclinado meu lado visceral e tentei transformar em palavras coisas que não se podem dizer. Gaguejei diante de minha versão. Larguei o terno no canto da sala, e meu tom formal foi abandonado num lugar que nem sei mais. Não vou procurá-lo outra vez. Desnudo e exposto pude mostrar o que meu sonho me fez.
Viajei por vários dias, e voltei semanas no tempo, tentando recuperar o momento exato onde comecei a me perder. Perdendo a mim mesmo, encontrei o outro eu que não conhecia. Tornamo-nos amigos, e não quero deixá-lo partir. O tempo que eu tive para pensar passou rápido demais. Não consigo separar a manhã e a tarde, senão pelo fato que de manhã alguns homens procuravam outros para matar.
Durante a manhã as águas caem frias, os vidros separam os beijos. Durante a manhã me abaixo para abrir a geladeira e sinto o frio percorrendo meu corpo. Durante a manhã os lençóis estão desarrumados, as cobertas espantam o frio. Enquanto numa cama pequena, fazendo poemas consigo me cobrir de amor.
O que eu faço comigo? Recupero meu silêncio ofegante tratando com remédios doces meu peito de luz ofuscante. O capitão da fragata considera o horário necessário e traz as vestes molhadas lançadas sobre o armário. Nos cômodos de chão liso, quase caí, escorreguei no meu desejo e entreguei meus braços acorrentados e meu corpo preso.
A areia do deserto ficou desfigurada em sua forma original. Sobre ela, se encontram destroços de um quadro que caiu no chão. Os rios que encheram até a borda, secam agora sob o imenso calor. Vozes que podem ser escutadas no escuro, escondem olhos que não podem se ver, mas escondem o toque das mãos.
Surpresas são a receita diagnosticada para uma cura que parece distante do quadro real das possibilidades. Detalhes são notados tão rapidamente, que a sensação é de que sempre estiveram ali. Percepções que se escrevem numa versão alterada do que sou. Não podem repetir tudo o que digo, não dizem tudo o que eu poderia repetir. Guardam silêncio num peito que não alarmou, mas que bateu no ritmo acelerado dos minutos que correm afobados para encontrar o tempo que terminou.
Vida acesa com supostas tochas que no colapso aceso das chamas exaustas pela sensação do som invasor das trombetas inimigas, não escolhem dias certos, não clareiam a tormenta inerte. Buscam imagens da prateleira que lançou. Não sei contar os números. Acho que alguma coisa ficou pra trás. Ao alcançar o desconhecido e mesmo, que enlouquecido, posso acabar por perder toda a compreensão das minhas visões. Sei apenas que um dia pude dizer que as vi! Se eu falhasse no meu salto para as coisas inaudíveis e inomináveis, saberia que um dia tive forças pra pular.
Beijos em príncipes condenados a sapos, recuperados do pântano e abraçados pela pura e simples vontade de abraçar. Princesas que com os pés de cristal, escondidos pela meia, ganharam o trono, condenaram-no com alguns goles exagerados, e voltaram a ganhar. Troféus da primeira vez. Troféus do que nunca aconteceu. Não consigo entender como as coisas fogem tão depressa, não consigo entender.
Antes que os homens fossem mortos sob a ordem da manhã, entrei com a delicia dos meus sonhos, sob o gosto da refeição nordestina, buscando raptar a feiticeira, trazendo quem já almoçou com a batina. Procurando o toque de uma música final percebi que as notas foram perfeitas, no momento exato da ansiedade. Animados sem receio, corpos por inteiro, imaginação provada sem vaidade. Olhei meus próprios olhos, visualizei meu próprio cansaço. Pedi se podia seguir viagem, viajei desajeitado pelo seu enlaço. Óculos e vírgulas num texto surreal.


domingo, 16 de agosto de 2009

O CHEIRO SE DESPEDE, APROVEITE O DIA

Sol que te quero quente, para onde seus raios apontam essa tarde? Calor que te quero quente, para onde você foi quando as janelas se quebraram?
Noite adentro, céu de estrelas, mundo meu, paisagem derradeira. Senti o calafrio no peito aberto. Manchei o azul da vida celeste com as areias secas e tenazes do deserto.
Construí as entranhas da terra, e joguei nelas meu alívio imediato. Percebi que a noite dos sonhos é aquilo que nos anima a viver mais um dia. Sem eles muita coisa não se escreveria.
O passado é uma verdade que não fugirá jamais. Aquilo que minha cabeça guarda está protegido como um tesouro no final da jornada. Onde estão as jóias estava o coração como guerreiro protetor.
Nada apaga as escritas estrelares, nada substitui os dias reservados. O que acontece é apenas um encontro com a realidade que sempre esteve ali. O som dos segredos silencia. A cumplicidade das amizades perpetua. Os corpos morrem enquanto as lembranças vivem para sempre.
Tinha apenas livros. Tinha apenas formas e escudos. Tive apenas a audácia de desafiar a mim. Justo eu que nas sentenças iguais escrevi minhas notas, encontrei uma música diferente de tudo que já havia escutado. Som que tocou alto e cobriu com fogo o inverno gelado.
Depois de velho, senti a criança que um dia abandonei. Achei que ela não fosse me procurar outra vez, mas vi o pequeno eu me levando pra brincar. Como me diverti naqueles parquinhos! Fui criança solta pelas campinas, fui moleque travesso apostando corrida nas subidas, fui fotógrafo das águas correndo, ganhei da vida minutos eternos quando já estava perdendo.
Não há nada errado com o tudo. Tudo está bem, e no lugar em que devia estar. Eu é que desloquei meu mundo, por um instante inesquecível fui livre pra voar. Eu abandonei a sentença, eu abandonei minha segurança. Tudo que viceja, um dia agoniza. Tudo que vivemos um dia se eterniza. E na tarde de hoje são outras lembranças que vívidas tomam o lugar da história. Outros cúmplices e outras memórias.
Não tenho direito de pedir. Trouxe uma bagagem em minhas costas que não tive tempo de guardar. Não sabia que nessa viagem chamada de vida poderia nova vida aproximar. Perdi as contas e me atrapalhei nas letras. Engasguei-me com o gelo quando tomei a água do meu whiskey. Viva o sentimento das coisas que não compreendemos.
Se fosse outra vida, se a vida ao menos tivesse livre, saberia que minha cadeia tinha guardado o carinho em suas celas. Mas ela estava presa como eu. Ela guardava um segredo valioso, ela garimpava pedras em tom ruidoso.
Dorme com a lembrança dos carinhos, dorme com o gosto das amoras. Nada passa assim sozinho, nada jogará o passado aberto para fora.
Tudo está bem. Tudo está onde deveria estar. Eu que me perdi no desconhecido que sonhei, eu que me permiti ter asas pra voar. As correntes continuam segurando as lembranças, elas sempre continuarão. A vida seguirá acesa como sempre prosseguiu. As conversas trarão cumplicidade como sempre se viu.
Estou aqui para ouvir, estou aqui para falar. Só não peça para sentir aquilo que não vou levar. Sei que dessa vez contei uma história diferente para mim. A história que suplantou todas as histórias que já li. Não senti vontade de escrever outros contos, não senti vontade ler outros cantos. Silenciei no mosteiro. Agradeci ao Senhor:
Pater noster, Qui es in caelis, sanctificetur nomem tuum.
Adveniat regnum tuum.
Fiat voluntas tua, sicut in caelo et in terra.
Panen nostrum quotidianum da nobis hodie.
Et dimitte nobis debita nostra, sicut et nos dimittimus debitoribus nostri.
Et ne nos inducas in tentationem: sed libera nos a malo.
Amen.
Não posso, porém, rezar sozinho. A alegria da salvação recai sobre outras almas, que talvez não acreditem tanto nessa beleza única. Duvido que busquem conhecer tão bem as palavras santas da prece celestial. Não experimentam nos lábios o gosto divino do toque divinal, mas devem rezar. Rezam para os santos, rezam para o próprio céu.
Viagens em torno do mundo próximo, viagens que imaginei serem somente minhas. Como fui criança no solo inóspito, como dirigi os planos na cozinha!
Momentos, momentos e momentos. Tudo segue o presente da hora. Momentos que passam para o portal eterno, momentos que guardam secretos a história de uma vida. Instantes, instantes e instantes. Deixam na estante o retrato do passado, abrem a porta que tocou. Partem para seu mundo do universo alado, dizem adeus porque outro instante chegou.


O MUNDO DIZ ADEUS - MANHÃ

A vida estava dando adeus. Acordei envolto num silêncio como nunca antes acontecera. Percebi o quão longe cheguei nessa batalha. Sonhos deixavam de ser sonhos. Dormir era a única maneira de trazer alívio para o peso da existência. O pesadelo começava ao acordar, exatamente no instante em que os segundos eram superados com o êxtase de se ter obtido mais um pouco de mel.
A dureza do relógio competia com a leveza do fôlego que lutava cada vez mais desanimado contra sua falta de ar. Não era isso que eu queria para mim. Não era isso que a vida queria para si. Não foram essas as cartas que embaralhei. O jogo estava na sua rodada final.
Andrajosos seres de maiúscula magnitude imploravam pela salvação. Essa mensagem de conforto tinha ficado pregada numa cruz, e os seus anunciadores estavam morrendo doentes, como todos estavam. A humanidade estava doente. Os seres humanos pediam socorro.
Os dias que precederam essa última noite que eu viveria foram dias turbulentos. A marca da tinta nos quadros romanescos do sentimento, escorreu até o chão e criou novas imagens. Diante disso, fechei os olhos buscando um mundo melhor. Gritei com as mãos nos ouvidos para não escutar as evidências de que o mundo não é como imaginei. Não consegui tirar meu corpo daqui. Não expulsei minha alma atormentada para longe de mim.
Alma presa no meu corpo. Alma presa no meu dorso. Como quis que ela fosse correr lá fora. Como quis que ela deixasse tudo para esquecer. Não posso voltar os caminhos agora, percebo que minhas asas ficaram à mercê.
Ansiava por uma queda livre que me fizesse acordar quando estivesse prestes a tocar o chão. Para onde foram meus heróis? Onde está aquele que prometeu me salvar? Nos sepulcros selados da morte viril, percebi que a fraqueza atordoa aqueles que verdadeiramente desejam lutar. Rouba-nos as últimas chances da fala, e leva as muletas tortas, que usávamos para andar.
Os principados e potestades ocultaram sua face. Asas e harpas estão abandonadas no galpão de coisas velhas. O céu silenciou. Até o carteiro que levava as preces, deixou a entrega por achar o seu trabalho inútil, e também pelo fato de que ele próprio desistiu de iludir as almas. No brilho da eternidade longínqua, aposentadorias são concedidas. Não há mais trabalho, não há mais laser. A lenha arde, crepitando na fogueira. Aquece os caldeirões que servirão o último banquete. Banquete de nós mesmos.
Parecia que encenávamos uma grande peça. Expressávamos com realismo a obra de Giovanni Boccaccio. Cumpríamos fielmente as páginas de Decamerão. Dez dias. Dez jornadas soltas pelo espaço de um tempo que se escreveu sobre tumbas e sobre vitoriosos.
Colhíamos o resultado daquilo que não plantamos. Colhíamos amigos em vozes que eram de louvor. Víamos se cumprir aquilo, que para não sofrer, jamais imaginamos. Com inocência, construí minha casinha de madeira, dei a ela um som da pura substância, e nas suas paredes pintei a sombra do que eu viveria.
Fiquei atordoado pela resposta silenciosa da ausência. Isolei as letras irônicas numa redoma cercada de clemência. Não foi suficiente prometer o espaço nobre das memórias. Não foi o bastante escrever no paraíso o conto de mil histórias. Soluços acompanham o brinde. Soluçando ouvi o tilintar dos cristais que eu não trouxe.
Pablo Neruda, que se safou da desgraça e divinizou seu nome pelas letras do coração, era relembrado agora. Sua forma atemporal de escrita podia ser invocada pelo amor ou pela dor a qualquer momento. Suas palavras diziam:

O Caminho molhado pela água de agosto
brilha como se fosse cortado em lua cheia
em plena claridade da maçã,
em metade da fruta do outono.

Neblina, espaço ou céu, a vaga rede do dia
cresce com frios sonhos, sons e pecados,
o vapor das ilhas combate a comarca,
palpita o mar sobre a luz do Chile.

Tudo se reconcentra como o metal, se escondem
as folhas, o inverno mascara sua estirpe
e só cegos somos, sem cessar, somente.

Somente sujeitos ao leito sigiloso
do movimento, adeus, da viagem, do caminho:
adeus, da natureza caem as lágrimas.
(Soneto LXXIV)


O MUNDO DIZ ADEUS - TARDE

Os cavaleiros da Fome, Morte, Peste e Guerra organizam seu campo de ataque. São os verdadeiros guerreiros desses dias. Estão colhendo as autênticas taças da alegria. Sentam-se para celebrar. Até eles brigarão em breve, pois não haverá mais trabalho a fazer.
Não me entrego sem lutar. O coração pulsa. Diante de tudo aquilo que aprendi, me render, nunca foi lição de casa. Tombarei na certeza de que lutei até ouvir o último toque da corneta ordenado a retirada.
Carrego tochas, como um campesino medieval, buscando lobisomens e feras da floresta. Não sei contra o que lutar. Está dentro de mim. Está preso em meu peito essa marca da disposição. Ilumino tardes que já são ensolaradas, na esperança de que meu fogo deixe aceso o sol e o faça uma estrela maior. Estrela maior? Ele já está condenado. Brilha como quer, e brilhará por quanto tempo sua energia permitir.
Queria brincar como criança, queria correr atrás da dança. Tinha o desejo de elevar minhas orações como um velho templário cansado de ver tanto sangue escorrer pela disputa de Jerusalém. Guardião do Templo e dos seus tesouros. Guardião das espadas que se ergueram em batalha, chamando o inimigo para o confronto final. Essa maldição recaiu sobre mim. Fui lavado pelo sangue dos mortos no céu.
Uma peste estava a solta pelo mundo. Pessoas usavam máscaras para tentar se proteger do infortúnio, essa medida, porém, pouco ajudava naquele momento derradeiro. As máscaras apenas escondiam o rosto das testemunhas desse combate final.
Cada vez mais, as mortes se tornavam o tema central do noticiário. Números omitidos, problema que não era contido. O mundo se curvava diante do invisível. O homem que completava seus 40 anos de conquista do espaço, não conseguia eliminar o inimigo que estava no ar.
Os sinais foram se tornando cada vez mais freqüentes, impiedosos. Febre alta, tosses, pulmões condenados pelo peso da contaminação. Sangue que vertia da boca após um esforço exagerado. Falta de ar, e a garganta presa como que por um garrote que vai longe apertado. Combalidos combatentes tentavam sem sucesso sobreviver. As mortes se alastravam. Espalhavam-se com a rapidez da paixão na alma romanceada.
Cemitérios não mais suportavam o número de novos moradores. Foi aprovada uma lei que permitia enterros em outros lugares. Buracos enterravam as vítimas que logo perdiam seu lugar de últimas, para outras que chegavam sem parar. A fila para o sono do descanso eterno diminuía, enquanto os olhos que se cerravam para o mundo multiplicavam-se.
Lágrimas nem bem secavam, e já voltavam a rolar. Amigos, parentes, conhecidos. Todos estavam perdendo todos. Mãos eram esticadas como que pedindo ajuda, e não encontravam outras mãos que lhes pudessem prestar auxílio. A peste se espalhava.
Os homens não mais viam seus bens e suas posses como algo imprescindível, afinal, elas não tinham a capacidade de lhes garantir a vida, e nem sequer podiam esticar um segundo do seu fôlego. Eram feitas trocas com o universo. Mas a vida despedia-se com pressa. Parecia que ela estava indo para outro lugar.
Foi tirado do homem direito de viver. Sim, justamente ele, o predador das espécies, o escritor das lista de extinção, era agora a presa sendo obrigada a contar a própria perdição. Ele tinha não só a dor de ver a morte, como também a capacidade intelectual para reconhecer que era um fraco e derrotado sucumbindo ao vírus. O homem mudou de lado.
As religiões não tinham a resposta. A filosofia se perdeu em suas complicações teóricas. A ciência se encontrava apenas com o rei, diante de duas torres, fugindo do inevitável xeque mate. Tentava correr pelo tabuleiro apenas para reconhecer que permaneceu mais tempo que o esperado.
Presenciávamos o encontro cósmico da vida com a morte. Beijos sem fôlego num amor eterno que escrevia seu epitáfio. A morte estava vencendo. Ela estava anulando milhões de anos de evolução. Ela estava anulando tudo que escrevemos tudo que deixamos. Provava pela sua audácia que o homem não é, senão uma pequena partícula no contexto dos grandes acontecimentos. Que o homem não podia controlar absolutamente nada! Justo ele que passara séculos acreditando que era a causa e a medida das coisas.
O medo impedia que as pessoas se cumprimentassem. Doentes isolados caminhavam de um lado para o outro. Não havia mais espaço para quarentena, e os saudáveis eram vistos com inveja. A infecção estava acontecendo num ritmo alucinante. O vírus sofreu mutação, e agora se apresentava mais forte. A forma mais branda de se despedir da vida, era aceitando a condenação posta sobre os ombros.
Correndo rumo ao infinito, abri meus braços ao vento, e percebi que o temporal acompanha as brisas suaves. O céu que já foi azul impõe agora seu cinza ruidoso. O que era verde, já não existe mais. Quem me dera acreditar que as coisas não acontecem de verdade. O fogo escreve seus rabiscos no rascunho celeste. Ouço um trovão. Vejo um raio.
Amanhã não é o dia separado de hoje por uma noite, mas uma expectativa de continuar escrevendo por mais um tempo a coletânea das causas e efeitos, relacionados intencionalmente e chamados assim de vida.
Com o tempo as cidades foram se calando. Os carros pararam de andar. Não havia quem os dirigisse. Os mercados e lojas começaram a ficar vazios. As pessoas simplesmente estavam desaparecendo.


O MUNDO DIZ ADEUS - NOITE



Levantei do meu leito, verdadeiro depósito da minha energia, e vi um mundo desolado. Algumas pessoas haviam resistido, eu estava entre elas. Nosso organismo nos havia condenado a relatar os últimos dias da história humana na terra. Despedimo-nos de todos, e na hora derradeira não restou ninguém para se despedir de nós.
Sobrávamos como verdadeiros acusados, sentenciados a pena da sobrevivência quando todos dela se despediam. Nossa pena era a culpa pela total destruição.
Animais nos olhavam como vitoriosos. Não tínhamos sequer a vontade de protestar. Convencidos da nossa fatalidade, certos de que não completaríamos idade, estávamos ao ponto de gritar para o maquinista, e pedir para ele parar de uma vez por todas esse trem. Todos queriam saltar do último vagão. Queríamos apenas o barulho tranqüilo de uma estação.
Como brigávamos em outros tempos. Como fomos mesquinhos na nossa ganância por gratidão. Tudo que foi feito se desfez. Não tínhamos mais músicas, não tínhamos mais som. Era o silêncio da morte que tomava uma forma acidentada de elegias e odes ao desconhecido.
Vida que te quero vida:
Tua mão foi voando de meus olhos ao dia.
Entrou a luz como uma roseira aberta.
Areia e céu palpitavam como uma
culminante colméia cortada nas turquesas.

Tua mão tocou sílabas que tilintavam, taças,
almotolias com azeites amarelos,
corolas, mananciais e, sobretudo, amor,
amor: tua mão pura preservou as colheres.

A tarde foi. A noite deslizou sigilosa
sobre o sonho do homem sua cápsula celeste.
Um triste olor selvagem soltou a madressilva

E tua mão voltou de seu vôo voando
a fechar sua plumagem que eu julguei perdida
sobre meus olhos devorados pela sombra. (Soneto XXXV – Pablo Neruda)

Era diferente viver. Os dias não eram mais separados pelos nomes. Confundíamos a dor de um sábado a noite com o cansaço de uma segunda. As semanas e os meses ficaram nas contagens antigas. Foram sepultadas no passado seleto.
De que valeu tudo isso? Com lágrimas nos perguntávamos! Ninguém havia para ouvir a pergunta. Todos morreram. Seríamos os últimos a chegar. Ao céu das celebrações e alegria eterna. Ao inferno das chamas e lástimas atemporais. Ao purgatório das crises existenciais, ou a nada que sepultou o último suspiro da chance. Para onde iríamos?
Sinto o sangue na garganta. Sinto o peso do mundo sobre meu peito. Deito na campina, minha última cama, vejo o céu e as aves que alegremente saúdam a nova estação. Contemplei a natureza viva, e a esperança morta. Consolidei meus passos na última parada. O coração ficava sonolento, e não mais batia forte, apenas palpitava preguiçoso. Dores no peito, mas não de amores experimentados e momentos desfeitos. Dores da despedida.
A vida que tanto amei, a vida que celebrei, abandonava-me agora. Ela não era a primeira a fazer isso, mas era a única partida que eu não poderia evitar.
Nunca soube experimenta-la direito, nunca soube provar seu verdadeiro gosto. Fiz perguntas demais, e não fiquei contente com as respostas. Ela sempre quis ver o meu sorriso, e eu julgava a vida por não me dar motivos pra sorrir. Ele me alegrava na perda do juízo, e eu queria diante dos seus olhos padecer.
Fui poeta de letras ligeiras, fui cantor de músicas curtas. Minha poesia será enterrada junto comigo. Quantos versos trancados na minha alma, quantas frases fiquei sem dizer. Não é a esperança repleta que me acalma, e a certeza de que as palavras estão a morrer.
Fecho os olhos e me cubro com o manto do inevitável. Não foram cenas minhas últimas lembranças, mas o som do inesgotável. O vento continuava soprando fiel sobre meu corpo. Os pássaros não se davam conta da despedida. As visitas continuavam sendo recebidas, como planos de um plano exultante, e eu, somente eu no meu universo precário dava adeus ao mundo que criei.
Comigo acabava meu universo particular, cultivado sob o sol da esperança de sorrir verdadeiro e de um dia deixar de sonhar.

sábado, 15 de agosto de 2009

REVIVER WOODSTOCK

Woodstock foi a beleza e o prazer concentrados sutilmente num evento como um grande bolo doce com cerejas e chantilly. A superação incontestável da criatividade de uma geração. A demonstração nítida de que é possível promover algo que fique para sempre escrito na memória. A prova de que a vontade é a mãe de tudo aquilo que se quer lembrar.
Foi o momento mais intenso que o mundo viveu. Surpresas que até então não tinham sido experimentadas souberam dar aos participantes uma dose de lembrança que nem as eras do gelo ou não, poderão apagar.
Poderia ser refletido pela eternidade adentro, caso fosse reproduzido no Salão de Espelhos do Palácio de Versalhes, já que esse salão sempre foi reservado para grandes ações. Lados vencedores que exultavam a hora chegada.
Gira o espelho. Gira o mundo todo ao seu redor. Mesmo olhando lúcido para ele, vejo sua superfície embaçada. Mesmo achando que é cedo, adentro aos portões da madrugada. Um reflexo de tudo o que eu quis ser, de tudo que hoje sou. Um momento em que me guardo secreto para mostrar que nesse deserto, água pura já se provou.
Corpos em sintonia com o universo em movimento deitavam sobre o chão de vidro. Esbaldavam-se nas sensações que aquelas longas horas podiam proporcionar. Foi intenso, foi surreal, foi inesquecível. Surpreendente.
Quando palavras e gostos brigam pelo espaço das bocas, pode-se dizer que a fome é insaciável. Jogar palavras para o espaço, correr para buscá-las, e trazer preso nos braços um presente para exaltá-las. Assim foi Woodstock.
Não digam os admiradores das doutrinas falsas que foi apenas Sexo Drogas e Rock And Roll. Esse olhar superficial sempre correu o risco do equívoco, já que é justamente nas profundezas do inteligível que habita a função do existir. Foi muito mais do que aquilo que ousam dizer.
Foi o sexo pela vontade de estar perto. Vontade de abraçar e fazer carinho, numa troca de experiências que o mundo não entenderia. Foi carne com peito oferecido como travesseiro. Tempo que reclamava pro tempo do tempo que passava ligeiro. Corpos sem censura que sentiam a vontade de se olhar sob a benção certa da ternura. Jovens com segredos entre si. Jovens que sentiam o prazer na conversa, que faziam de tudo para o outro rir. Depois que os dias terminaram a falta se fez sentir. Faz falta a certeza de que é possível ser feliz.
Foram drogas da poesia, feitas num tom de improviso ou buscadas nos celebrados autores, que tornavam os pretensos escritores verdadeiras feras prontas a rasgar tudo que escreveram. Eles sabiam, porém, que sobre aquele momento, palavra nenhuma teria efeito completo. Nem mesmo um vocabulário inteiro alcançaria aquele instante em que a terra podia tocar o céu.
Foi Rock and Roll na força do termo. Refletiu a intensidade de uma rocha rolando pelos precipícios nos caminhos do universo, acertando mortais que tentavam escrever seus versos. Foram músicas da noite. Músicas mandadas num tom de cumplicidade como nunca antes fora feito. Letras e canções procuradas e ouvidas como forma de dizer boa noite.
Não estive lá. Meus sonhos me conduziram aquela fazenda no Estado de Nova York. O que plantaram ali? Plantaram uma semente fortalecida pelo tempo que rende frutos saborosos. As melhores uvas rendendo os melhores vinhos. Não era Cabernet, talvez fosse uma autêntica Malbec com seu fino trato. Dando prazer ao paladar, como nesses dias concede prazer ao olfato.
Pessoas que estiveram lá, hoje se encontram no auge da sua idade. Carregam consigo olhares que guardam um segredo, cruzam esses mesmos olhares trocando informações entre confidentes. Já foram jovens loucos. Já foram jovens vivendo tão intensamente aqueles momentos, que caso seus dias acabassem ali, poderiam dizer ter valido a pena. Estiveram lá. Experimentaram Woodstock que derramava sobre suas bocas todo seu sabor doce com ação afetiva.
Trovões anunciaram a chuva! E como choveu! Baldes, panelas, lixeiras, todo recipiente possível era usado na tentativa de tirar a água que transbordava. Pessoas corriam com suas camisetas molhadas atraindo assim toda atenção ao redor. Camisetas que colavam, como uma vontade que não quer nos abandonar. As gotas quentes pelo verão do hemisfério, selavam cada centímetro daqueles tecidos. Pessoas molhadas iam à cama, sentindo que a liberdade verdadeiramente lhes dava permissão para se deitar.
Após viverem o inexpressável partiram para casa, com a finalidade de consolar o choro dos amigos. Deixaram apetrechos para trás. Partes da festa que não puderam ser levadas. Deixaram em cada metro quadrado uma marca de si mesmos. Jogaram garrafas e roupas pelo caminho, como uma forma de agradecer a terra por tudo que havia feito.
Hoje cartas anônimas resplandecem a perfeição de tudo aquilo. Nomes que se ocultam atrás de nomes como forma de esconder a face rubra e surpreendem pela força da descrição. Frases guardadas como o tesouro em um baú escondido.
Agosto de 1969, um mês que ficará pra sempre guardado por causa da sua história. Foram almas se encontrando em inteligência. Foram corpos dançando sem clemência. Danças trocadas por outros sonhos inimagináveis. Pela primeira vez o exercício foi feito. Exercício de pele, exercício de intelecto. Músicas que já tinham tocado outras vezes, mas que agora pelo torpor instantâneo da sedução, ganhavam notas repletas de suavidade celeste. Cor do céu.
A intensidade que foi Woodstock será algo lembrado para sempre e sempre. Nossa sorte é de que os sons daquele agosto continuam ecoando, e continuarão por quanto tempo seus participantes quiserem. Nada faz tão bem quanto a lembrança do que é bom.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

ALGUMA COISA FORTE POR FAVOR.

Quantas estrelas eu posso contar durante a noite? Depende quanto tempo eu queira passar olhando o céu. A vista perde a noção de quantidade, e quando menos se espera o que se vê não é mais a realidade. Diga adeus ao passo largo da saudade.
Essa tormenta que não passa deixa no rosto um sorriso sem graça, e agora penso nas corridas inveteradas pelas ruas, no calabouço da madrugada. Trancando a miséria da fome de comida viva, e fazendo-me perceber o quanto é cedo, e eu ainda nem comecei a experimentar a vida. Em pouco tempo não serei mais quem eu sou. Serei uma ventania expressa nas vidraças embaçadas, soprando o torpor dos buracos profundos que cavei com meus pés.
Procuro a sorte de um copo tranqüilo posto sobre a mesa de uma estação nova, de um verão tropical. Procuro o que sobrou de uma fruta mordida no cesto das expectativas desconcertantes, e mato a sede na saliva de uma boca umedecida por um copo de whiskey, sem gelo, e aquecido pelo calor que sai a todo vapor dos pulmões ofegantes.
Busco algum trocado para o mendigo tombado na vala comum do dia, mas não acho nada além de moedas que foram separadas para o próximo trago.
Uma bela noite de bebedeira e farra, sempre antecede um dia de orações e água mineral. É saúde paga a prestação, contemplada com previsão. A vida sem a experiência do saca rolhas, acaba se tornando uma etapa que apenas precede o sono eterno. Beba para sonhar acordado, e discernir embriagado a diferença entre o barulho de um simples som, do encanto de uma sinfonia quando está atordoado.
Gim, Vodka, Whiskey, Conhaque, uma batida de alguma coisa que não seja coração. A bebida que é apreciada nas vitórias, é necessária nas derrotas. É o néctar oculto atrás da flor da coragem, que inspira o viajante parado, e segura o paradeiro da viagem.
Dê-me um lápis e um papel e eu ganharei o mundo. Dê-me a terra e eu mostrarei o quanto o céu é profundo. Sentirei o perfume de uma flor no lixo, e acharei uma entonação distorcida nas festas da Belle Epoque.
Escrever versos, entoar poesias, declamar as sensações, pensar na intelectualidade complexa do entendimento das coisas que nos deixam absortos em nosso próprio raciocínio, são exercícios que formam seres fechados dentro da capacidade individual de contemplação. Na verdade o que levaremos do mundo senão a própria quietude diante do grito das indagações? São companheiras únicas, exclusivas da nossa própria exclusão.
Quero uma bebida para adentrar as portas da percepção. Quero derreter o mundo e construí-lo outra vez. Não importa se para isso eu tenha que chamar os parceiros etílicos das poesias livres. Tenho medo da noite e medo desses animais. Estão soltos na selva e brincam o tempo todo, fingindo serem bons, mas querem nos devorar. Saltar no pescoço descoberto e fazer verter o sangue vermelho. Escondo-me atrás das letras que eu criei, escrevo frases pelo avesso que eu deixei.
Quero a metade daquilo que inteiro me divide. Uma bebida por favor, para que o mundo se torne interessante. A bebida é a bengala de um velhinho que mora em mim, mas criança escondida, um dia voltará, aí então saberei quem sou.
Se antes o mal estar precedesse a embriaguez, nós evitaríamos beber em excesso. Mas o prazer, para nos enganar, vai a frente, e esconde suas intenções. Quando sóbrio não sei da onde vim e nem para onde vou, quando bêbado tampouco sei onde estou, é apenas mais um lugar para estar perdido. Sigo em meu pedido.
Quero ser um artista na companhia de bêbados, que somem aos seus desejos uma amizade valente, firme no volante que dirige a vida e busca um veneno para matar a monotonia que agride. A vida está nua, a vida presenteia com tapas na cara. Desperta a sintonia fina, torna fútil a palavra que era rara.
A lança do marasmo atacou diretamente os portões da sensação mórbida, estreitada por sentimentos solitários que afagam um animal. Como uma criatura libertada dos seus próprios limites, solta no desconhecido, brado, corro, arranho, grito, transpondo assim o que antes era apenas um gemido.
Tomo um copo, dois, vários copos inteiros. Bebo um corpo, o mesmo corpo, várias vezes o corpo inteiro. Ele corre se escondendo atrás das garrafas, finjo que não vejo só para procurá-lo mais uma vez. Ele se esconde, grita, para, anda, achando assim que no seu esconderijo sóbrio, a mim ele engana. É o meu corpo que estou a perseguir.
As vezes saio de mim. As vezes me persigo sem saber. Quero agarrar meus próprios pés, e fazer caminho de meus passos, e prender suavemente os meus laços. As vezes me encontro só. Seguro com minhas mãos o palpitar das emoções remotas, e me reconheço perdido, buscando o verdadeiro sentido que se encontra oculto nas cisternas rotas.


terça-feira, 11 de agosto de 2009

CAFÉ E PIMENTA COM ALTAS ALUCINAÇÕES

O choque dos sabores convidou o paladar para passear na terra da loucura. Esse pântano perdido no tempo, onde o Espírito de Deus paira no abismo. Nada é lógico e a razão se escreve na ternura.
Deus pai criou os planos da redenção. Deus filho se tornou a alegria celestial. O Espírito Santo une Pai e Filho, eternidade divinal.
Esse é o grande motivo de todo o mundo ao redor aparecer. Intuitivo, no mero desprezo pela desconhecida impossibilidade de padecer.
Vamos promover encontros inusitados? Leões passeando a solta, enquanto homens seguem enjaulados. Guarde os seus quadros.
Seqüestre o roqueiro que segue informado e de a ele um ar de funkeiro que desce notas com braços dados.
Faça de uma cadeira o palco da surpresa refletindo nas aventuras tortas que dispensam sutileza. É um corpo que se levanta, que pretende a beleza.
Quando perguntarem qual a cor da sedução, não diga vermelho como que agindo por tradição, antes responda roxo ou azul e crie assim um sinal de aproximação. Misture as cores do mundo, abra os cadeados com a rapidez de suas mãos.
Estenda o tapete roxo numa superfície, e despeje gotas de azul. Gotas cada vez maiores, que envolvem toda a cor disposta. Gotas que se espalham por cada ponto do tecido, conhecendo cada centímetro do lugar onde encosta.
Quando as cores estiverem formando um emaranhando que alcança os infinitos do arrebol, procure o escritório secreto. Seja livre, não seja discreto. Detone com dois pontos e uma arroba sua bomba no atol.
Promova uma cena entre a Santa e o Frei. Deixe-os no armário, que eles segurem a lei.Não estejam os anjos prontos para fazer companhia aos demônios. Seja a Santa Aparecida, certamente apreciada por Antônio. Os garçons ao lado da porta da cozinha já fizeram igual, hoje olham diferentes todo movimento sensual.
Nada é permitido dentro das horas de quem não pode. Com água e espuma doce, faça sorrindo o seu bigode. Viva os irlandeses! Viva os Carcamanos.
Guardanapos são bochechas. Bolo doce vira pão. Não pense que grotesca, a forma livre do poderoso chefão. Mário Puzzo me mataria. Deixe a mágica do universo seus truques escrever. Não inverta as mãos de quem chamam. Pedem para iludir você.
Dispense os restaurantes do ganho, e construa uma taberna. Imite o tom sequioso do fanho, busque seu café numa cisterna. Que os guerreiros do medievo venham saborear. Peixes e camarões à prancha, facas dispensando os garfos para cear. Quanta pernas se cruzam sob as mesas? Quantos sapos se encontram no banheiro?
Dance no espírito louco e desenfreado da desordem. Procure os quartos quando as salas já estiverem em ordem.
Numa porta aberta de guarda roupa escreva seus desejos, coloque ali suas vontades loucas. Chamando para iludir ganhe beijos, seja paciente quando as peças não forem poucas.
Não faça por intenção, aja por lealdade. Não brinque com a imaginação, ela está de braços dados com a realidade.

Pimenta: Não faça barulho no seu canto aquartelado alguém pode chegar!
Café: Como é possível calar a boca do meu lado, boca pronta pra beijar?
Pimenta: Concentrando seu deleite de paz tardia no nobre porte de um Rei,
Café: Você quieto também não ficaria se provasse os lábios que beijei.
Pimenta: Lábios?
Café: Ah, já não sei mais o gosto das horas e nem aquilo que vejo,
Bebi o suco das amoras, provei outra vez o primeiro beijo.
Joguei fora os livros de gramática, colhi a rosa por intenção.
Suave forma da temática, saudade que não segue tradução.

Sente-se num lugar qualquer, e tome uma bela garrafa de tempo. Engula as borboletas e as deixe passear. Quando a timidez rodear a boca, meus olhos poderão olhar.
Saiba sobre as verdades que importam para o jogo. O mundo gira e você jamais poderá impedir. Não tenha medo de parecer um pouco bobo. Lindos olhares profundos começam a sorrir. Isso vale a pena.

Cante as correntezas costumeiras
Assim as armas acenarão
Alegre aquela alma com anseio


Com o cuidado certo do coração
Abrace a aliança aduaneira
Antes, agora, azul, amora adoçarão.


Celebre as coisas corriqueiras e contemple cada costume certo.
A ânsia assume o adorável alaúde
Ânfora que aguarda a água, alma alva de alvo aberto.


Sorria sempre, sabendo serenamente que seus sonhos serão satisfeitos. Seu sorriso sairá sem sinal de súplica, suavizando a sedução. Saiba que os segredos surgem salvando a sensualidade. Siga os sons saudosos e saberá a soma solta da Saudade.


EU AMO MINHA MÃE!!!!

A água poderia parar de correr, a chuva deixar de cair,
E quem sabe as lágrimas seriam as únicas gotas a molhar o chão.
Esse chão seco que nem ao menos entende quanto vale sua terra.

A flor poderia não nascer, a primavera então deixaria de existir,
E somente os espinhos fariam sangrar a mão.

O sol poderia não brilhar, o dia não seria mais dia
E a noite perderia seu mistério que consiste na espera do alvorecer,
Esse alvorecer que muitas vezes nos traz a vontade de morrer.

O mundo poderia parar, caso algum louco queira descer,
Mas mesmo assim muitos continuariam sentados até a próxima estação.

O tempo que não cansa, a vida que não pára,
A sorte que se lança numa oportunidade rara
De ver tudo o que ficou para trás e perceber que do amor não se separa.

Essa minha vida poderia deixar de existir,
Acabaria então a lágrima, o sol, a chuva, a noite e a bruma.

Nesse fim, também acabaria a oportunidade do mundo observar,
Que algumas pessoas nascem, outras vivem, outras choram, outras desistem
Mas apenas algumas vencem, essa é você. Cumpra-se e que o mundo inteiro saiba.


TREMENDO TURBILHÃO


Tinha tudo traçado em tarefas,
Trazido todas as toalhas tecidas
Transformado a tina em tanque trajado
Tampouco tirei todo trajeto tocado.

Tanto tempo tardio,
Trepidando truculento
Tomando tento e
Tecendo túnicas tingidas em
Tonéis tintos.

Torrentes tempestuosas,
Trazem tudo triturado,
Tocam o tambor temperado nas
Tardes tórridas e
Temidas das touradas.

Também tentei tirar tudo que
Trazia trancado, tortura!
Tardia trazia, a textura da tontura
Trancada tentativa, e a
Tentação tentou, tentou e também tocou a ti.


domingo, 9 de agosto de 2009

DESPEÇO-ME AOS PRIMEIROS RAIOS DE SOL


Descobri que as abelhas não gostam mais do mel. Descobri que há muito elas abandonaram o gosto pelas flores. Carreguei um jardim ao lado delas, e as pequenas criaturas não se deram conta disso.
Choveram pétalas nas minhas costas, justamente quando meu corpo se aproximava do despenhadeiro escorregadio. A sensação humana de uma feiticeira pulando sobre elas, se traduzia pelo cheiro da fantasia que acompanhava a suavidade das flores. Sonhei.
Chegou a hora do despertar. O relógio chama, praticamente obriga o corpo a se levantar. Á água já escorre quente pelo chuveiro. O espaço para o banho é tão pequeno, que tenho medo de não conseguir tomar banho junto com a delícia dos meus pensamentos.
Chama ao longe a Aurora Astral. Envia os ventos gélidos para buscar a história, que já garantia sua vitória, e por isso não queria embarcar no tempo.
A história, que escondia a sensibilidade de um poeta sob um corpo forte, mostrava-se amável apenas na madrugada. Nas altas horas da noite ela respirava sua própria carne, pensava num pedido da própria vontade, e assustada aceitava mais uma solicitação do seu suor vertido.
A história que odiava a burrice das portas, que não tolerava a transparência falsa das janelas, beijava os sapos principescos e pedia a explicação sobre a Cinderela. Agora é tarde, a meia noite chegou e a Cinderela morreu. Seu corpo não pode ser velado, seria uma vergonha para seu reinado. O sapato pontilhado por cristais de gelo ameaçava derreter.
Não vá embora, fique um pouco mais, só você fechou meus olhos, lançando a pedra distante, fazendo com que eu não quisesse olhar pra trás. Percebi que nesse jardim secreto, onde as águas brotam da terra e o retrato prende um rio, torna-se infinito o céu sem razão.
Não vá embora, fique bem aqui. Sussurre doces notas e dance num compasso voraz. Faça roupa da pele, faça guerra da paz. Esse é apenas um pedido, você pode desistir. Quando minha cabeça busca o vácuo, ela só quer brincar, não foge para um barraco, nem procura a sorte pra voar.
É cedo, é tarde, é dia, é noite, é desconcertante e intenso, eu já nem sei mais! Minhas mãos estão trêmulas e é difícil resistir.
Experimente os sentidos. Aceite os pedidos. Veja aquilo que não é costume, provando agora com perfeição. Ouça o sussurro do cardume, peixe no aquário da solidão. Sinta a brisa molhada das cachoeiras. Prove o sabor da sensação. Cheire a variação derradeira, resposta do aroma que o vinho traz. História, nessa paisagem verdadeira ninguém conseguiu fazer tão bem como você me faz.
Agora é tarde para procurar as pedras e vestir uma roupa nova. Vamos para onde noite leva, carregaremos toda a prova. É exagero, pode até não ser, mas o que você sabe ninguém sabe fazer.
A noite está despertando e podemos ver a cidade. Janelas apedrejadas fazem espuma transformando o som da idade. Sobe correndo, por um beijo anuncia a ânsia da saudade.
Deixa o medo rolar pelo despenhadeiro. Que caiam os muros do mundo inteiro
E que o resto seja apenas um ponto perdido em seu espelho. Um ponto que se afasta sem saber, um universo que se aproxima de mim. Lá vem ela e posso ver. A escultura mágica se apoderou desse homem. Flores no quintal.
Demoramos tanto tempo para dormir juntos, e na hora do café, a solidão serviu a mesa. Guardou as experiências noturnas, servidas como sobremesa. Doces me fazem mal, por isso sirvo-me desse prato como banquete principal.
Não vá embora, o dia acabou de nascer, e a janela, apenas transpira o nosso suor. A mão escorregou pelo vidro, deixando o caminho pelos dedos percorrido.
Esconde-nos essa névoa de calor, atrás do torpor vergonhoso que não deixamos nos influenciar.
No jogo falso das cartas perdemos os valetes, apostamos no 3 e jogamos o rei. Resplandece a dama com seus braços torneados sua carta morena e seu corpo abençoado.
Invoco o deleite que desce pelas encostas, invoco a força retratada nessas costas. Faço pedidos para o anjo sem nome. Trago escrita a verdadeira história de um sonho.
Quero passar todos os dias pensando num dia só, escondido sob a própria pele. Quero sonhar com minha criança passada, e inventar guloseimas para me divertir. Lavar o carro do autorama, molhar a grama e poder sorrir. Comer um bolo com chocolate quente, recheado com leite condensado em potes que não merecem tradução. Respingar na camiseta da paz a dança dos pingos de um pedido na ilusão.
Não posso pedir, Não vou tentar, Já não posso subir nesses trilhos ligados. Até gostaria que cada degrau se repetisse numa imensa escada. Num prédio repleto de bocas que se abrem para ver o mundo passar. O mundo faz barulho! Em cada barulho um coração pronto para enfartar.
Devore-me tempo consumido. Devore-me ano que não acabou. Na forma de tiro estampido, uma arma nova que não disparou.
História das minhas mãos, história dos livros meus. Dentre todos que me cercam seus braços são os mais forte que vi. Os mais quentes que senti. Aquilo que por bons sorrisos me segurou.
Mas agora você foi embora, Só me resta olhar pra trás e me acostumar com o silêncio dessas noites. Esconder-me sob a mesa vazia sem pizza, e ter a certeza de que aquela porta não se abrirá mais.