sábado, 8 de janeiro de 2011

SOMENTE SAUDADE


Trago comigo as dores de uma paisagem com definições abstratas. Procuro experimentar diariamente a vida.
Pensei que colocar os sentidos a prova e absorver cada sensação proporcionada, talvez seja, a única forma de ter certeza de que nossa existência é real.
Desmedido das minhas virtudes calmantes eu escrevi silêncios, noites, anotei o inexprimível. Fiquei com as canetas do sangue vertido e pulei no oásis por mim concebido.
Criei todas as festas, todos os triunfos, todos os dramas. Fiz comédia com meu vulto despercebido e tentei inventar novas flores, novos astros, novos idiomas. Tornei-me um poliglota das sensações sem pátria.
Criei meu relicário para depositar a minha personalidade triste. Meu olhar perdido em contraste com minha boca sorridente.
Fiz peças de ouro amarelo e espalhei seu plano sobre a ametista. Do mogno nobre do meu peito retirei as lascas que como farpas perfuravam minha razão e sustentando uma cúpula de esmeraldas abracei solitário o meu castelo sonhado. A piscina dos lamentos ganhou o cheiro das rosas e da fantasia, me senti puro outra vez.
Banhei-me na confusão profunda e lancei âncora no mar doce, pois o sal das suas lágrimas deixou há muito de existir. Hoje celebra as correntes que dão ao infinito oceano o sabor de um licor envelhecido pela experiência de cada frase pendurada no batente da vida. Mais doce para este menino é sua vida, do que os frutos maduros na proa da embarcação.
A água que escorre do seu corpo lavado entranha-se em meu madeiro, e então com as escuras manchas de um vinho bom me embriago anoitecendo inquieto permitindo a minha satisfação.
Eis que a partir da sua imagem eu banhei meu poema. Desse mar infuso de astros eu tirei uma estrela e nessa aparição interna de cadáver pensativo que vaga, entre meus braços, quero revê-la.
Cansado de tentar me compreender, e mais cansado ainda por tentar fugir de mim, resolvi explicar meus sofismas mágicos pela alucinação das palavras e acabei por considerar sagrada a desordem da minha inteligência. Abracei a arrogância para me defender da maldade do mundo.
Jamais a esperança parou num ponto sem movimento. A ciência da minha ignorância foi a paciência do suplício lento. Espero pela vinda da manhã, mesmo que a ardência dos meus dias surja queimada pelas brasas que não são vãs, e o ardor encontre a eternidade no mar misturada com os brilhos do sol que amarram as lembranças para que nunca mais deixem de brilhar e permaneçam vivas como substâncias do meu amor.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Tumba aberta, inquieta, nascente. Amor, respeito ardente!


Sou um caixeiro viajante. Sou um descobridor das possibilidades ocultas em cada frase misteriosa. Vivo num mundo único, habitado por quem amo. Faço letras das pedras mortas e escuto em tudo um pouco do nada. Dou ao som o tom desejado e encanto com melodias um coração silenciado.
A quietude desses dias ajuda a acalmar meu espírito inquieto. O contraste entre o eu ímpar e a falta do meu par estremece os dias longos que não vejo terminar. Achei uma forma, achei um lugar e enquanto a vida não começa, aguardo em silêncio o meu caminhar.
Nesses dias a solidão me encontra num quarto vazio. Pela janela da sacada olho o infinito e sinto que as cortinas se abrem para o sol a cada novo despertar. Armo minha saudade e ela com munição repleta atira sem piedade no coração deste homem.
É ruim ter uma voz apenas guardada para si. Estou cercado de pessoas e penso na única pessoa que não está aqui. Encontro você nas madrugadas dos sonhos angelicais. Encontro contigo para dizer que ainda existo e não me esquecerei jamais.
Fecho-me num canto escondido de mim mesmo. Visto a armadura que guarda aquilo que sou e sem o qual não seria. Cuido do precioso tesouro destinado a você. Você recebeu, você receberá e sempre o tesouro será seu. Piratas foram banidos, mastros foram erguidos, bandeiras foram postas e o nosso navio finalmente alcança a terra.
Pego suas mãos em meus pensamentos e sinto o gosto da sua pele quando fecho meus olhos. Junto a ideia com a sensibilidade da matéria e assim tomo remédio para a solidão.


domingo, 2 de janeiro de 2011

CAVALEIRO DO ZODÍACO


Dos precipícios desse universo nebuloso lancei meu espectro.
Não muito certo da sua missão, ele viajou pelas profundezas desconhecidas das constelações e tocou os pilares da criação. Fez das explosões estelares seus fogos de regozijo. Proclamou a si como o padrinho nas novas galaxias, e a pontos luminosos perdidos na imensidão do que é simplesmente tudo, deu nomes que refletiam sua busca por um ambiente conhecido.
Visitou o círculo de animais e investiu-se defensor e arauto de cada uma daquelas figuras, com as quais partilhou seus dias sem horas, já que o tempo havia ficado congelado num plano meramente racional.
Com o carneiro ele compartilhou a lã, e aprendeu sobre a arte da guerra que o haviam transformado no próprio deus das batalhas. Áries foi seu defensor e companheiro. Com o touro ele aprendeu a força da persistência e o valor de uma boa discussão por causa da teimosia. Percebeu duas figuras semelhantes, e geminados em três entenderam que cada ação poderia ser refletida no outro, aprenderam assim que o impacto do que se fazemos se faz sentir no plano universal. Com o caranguejo soube compreender que nem sempre as metas estão na nossa frente, basta procurar e mirar os objetivos, estejam lá onde estiverem. O susto foi grande com o rugido do leão. Um rugido que rompia o conceito físico de que o som não se propaga no vácuo. Ele praticamente berrava com a força de seus pulmões felinos e impunha sua vontade de rei. Mas percebeu que não resistia a uma aproximação destemida, e vencida a barreira criada, mostrou-se o mais carinhoso dos animais.
Banhada nos rios de águas brilhantes estava a virgem. Mostrou o valor da inocência, a força da observação e a cor da pureza, perdida entre animais, se impunha como unica forma repleta de alento.
A balança era algo muito sensível! Ponderava, refletia, decidia, e emitia suas opiniões após avaliações que se mostravam matematicamente exatas!
Surpresa com o escorpião. Seu ferrão não era um ataque, mas uma defesa, sua armadura não era uma lança, mas um escudo. Sua desconfiança estava nas possibilidades distantes, e talvez por isso não vivesse intensamente como todos os outros com os quais havia conversado.
Dos campos celestes se ouviu um galopar. Pernas fortes como um cavalo da andaluzia, tronco ereto como um estadista platônico e o dualismo constante e eterno daquele que trazia sobre si a força de um animal e o coração de um humano. Seria capaz de ser extremamente grosseiro e sem perceber abraçar carinhosamente num tom fraternal. Com ele a conversa rumou ao infinito.
A cabra do mar observava e intensamente me dizia que o caminho estava quase terminado. Meu rol de conhecido tinha aumentado num piscar de olhos. Vale lembrar que aqui, um instante é quase eterno, e passa lentamente.
Preso numa redoma de vidro, a consciência relutava com os limites. A água se fechava num espaço único e praticamente impossível de observar.
Para sair dali e continuar explorando o inacreditável olhei os peixes. Navegavam pelas águas do sabor vital. Buscavam os brilhos dos espaços siderais e sonhavam com a eternidade que estava cada vez mais próxima, ao passo que a morte já não era um medo e o fim estava cada vez mais distante.
Foi puxado pelo cometa, que com seus rastros luminosos dava ao céu novos tons cromáticos,
Meu espectro se materializou e refletiu em cada estrela conhecida um pouco do eu que guardava como sepultado. Não tinha mais segredos e não tinha mais dor.
Desrespeitei as rotas, as esferas e os limites do infinito universal! Procurei saber até que ponto os recônditos do nosso espaço eram conhecidos e possíveis de explorar pelo até então espírito (e agora matéria) de um curioso das rotas celestes.
Procurei Deus no vazio do infinito e não o encontrei no céu. Percebi que ele estava mais dentro de mim, além das camadas possíveis de observação, foi então que conclui que existia um universo maior e mais inexploarado ainda. A viagem teria que começar outra vez!