terça-feira, 30 de novembro de 2010


Ao amar você repetidamente eu me perdi com a felicidade que me brindava todas as manhãs.
Não percebi que a perfeição de um afeto se expressa na simplicidade de um carinho feito pelas mãos.
Tentei dizer em frases silenciosas tudo que meu coração sentia naquele instante do dia que eu só queria provar que eu ainda existia.
Palavras são meu brinquedo, a não ser quando as quero com toda a vontade de um amor que precisa delas para se expressar.
Ando em círculos, penso em círculos, e procuro maneiras de repetir para você aquilo que já está tão claro pra mim,
Eu deixaria a chance de ouro passar por mim, eu deixaria o sol se despedir pela manhã,
Eu deixaria o cheiro do perfume solto por aí, eu deixaria o inverno chegar sem avisar,
Mas não poderia deixar você partir sem mim,
Não poderia deixar você sair sem dizer tchau,
Não poderia viajar sem lhe abraçar e dizer Amor,
Não poderia acordar e ver que você se foi.
No vapor do dia, quando as águas deixam a terra e passam a brindar o céu, sinto o calor de um corpo que distante pensa em mim.
Com você aprendi a distinguir o paraíso do inferno. Com você os anjos se tornaram humanos e passaram a me dar olá. Percebi nesse encontro dourado que somos apenas duas almas completas nadando num aquário que não tem vidro, não tem água e não tem fim.

Há tempos eu sei que eu não sei viver sem teu carinho, cada dia eu consigo lembrar mais que nunca esqueci da nossa vida sempre juntos.
Não sei o que virá depois, não sei como será amanhã, mas descobri nessa aventura que vivemos que o futuro é aprender a ler aquilo que não está escrito e interpretar os pequenos sinais nas nuvens nas estrelas!Não há provas daquilo que pode ser o certo. Vivemos tão pouco, mas quanta coisa amor vimos se perder e quantas coisas encontramos pra alegrar o coração. E é justamente nessas horas que eu acredito que certas vezes é melhor se entregar à ilusão de que nossa vida não se acabará e que nos beijaremos sempre outra vez. Vamos brincar a noite inteira e rir de tudo outra vez, assim escrevemos para sempre nossa história que começa pelo avesso e termina num final feliz.



SEM SEGREDOS


Já contei minha história sob trovões silenciosos que retumbavam dentro da minha cabeça. Quando experimentei a seca das terras áridas pela minha falta de imaginação, fiz-me humilde e busquei nos mais simples sentimentos encontrar as evidências que tanto precisava.
Seu beijo salgado pelos ares do mar despertou o mundo sobre nossa existência. Passamos a existir como carne.
Quando os ventos do coração assopram seguimos fantasmas do amor, os nossos fantasmas do amor se tornam reais quando perdemos o medo de amar.
Eu deveria fazer tanta coisa! Eu deveria ser tanta coisa! Eu quis fazer tudo diferente! Sucumbi diante do que pareceu-me mais louco.
Para que metais, se é de madeira a ponte que construí na minha imaginação? Para que perfeição, se minhas atitudes são imperfeitas?
Vi o mundo mudar, vi as coisas mudarem. Vi meu destino tombado, e erguido um novo horizonte sob os meus pés. Era hora de deixar o mundo correr!
Venha comigo e esqueça as flores e as pinturas de tempo sobre o seu rosto. Esqueça tudo que já tenha ouvido falar sobre a vida, e saiba que em um coração fechado os anos esperaram e construíram um longo caminho.
A noite foi de angústia, com segredos dilacerados como ossos fraturados, ambos aguardando um alívio para sua dor. A noite não aguardo o poente, mas se levantou a tarde enquanto as mensagens avisavam o mundo sobre sua nova atitude.
Com a escuridão o navio peregrino lançou âncora num porto belo e pode ouvir a música que soava desconhecida, mas que traduzia a história dos encontros imaginados.
E o dia veio vestido com poesia. Falamos de sonhos que não lembrávamos, pedimos as bençãos sobre aquilo que buscávamos.
Sem lágrimas, olhos limpos e molhados! É hora de ir..
E logo você vai sentir o cheiro da manhã e o mar canta desaguando perto de você.
Caminhamos muito para encontrar descanso. Abrigo dos braços fortes, calma de um remanso,
E se você quiser alguém vestido com poesia para cobri-la com amor sem pedir nada, saiba que estou aqui.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

CAAAIL


O uivo que desesperadamente correu morro abaixo, fez tremer as paliçadas erguidas para defender o inculto poeta dos seus temores. As folhas, que antes serviam de tela plena para o verde das suas árvores, apresentavam linhas que numa angústia mórbida, sustentavam palavras sem muito cabimento.
Estava encostado num tronco, sentindo o vento cortante, com os joelhos dobrados e o bolso da jaqueta cheio de canetas. Apoiava sobre os joelhos algumas folhas velhas, nas quais escrevia minhas memórias, minhas lembranças, meus desejos. Queria aumentar minhas possibilidades! Queria ter mais o que escrever.
Como o tempo passou em vão! Como busquei segredos ocultos nas rochas. Como fiz texto com a linguagem metafórica que procurou uma veia de realidade, e encontrou o barril dos simbolismos que sempre se fizeram presentes antes de serem chamados.
Enquanto tentei obter da tinta da caneta uma colaboração imaginária de escritor adjunto, me deparei com a cena mais estranha que já tinha observado: Vi a mim, encostado num tronco, apoiado sobre os joelhos, tentando escrever algo. Não me vi na imaginação! Era real, era o mundo físico. Poucos metros me separavam de mim mesmo!
Onde foi que senti o corpo sendo separado. Não estava morto, não estava vivo. Estava duplicado! Nunca havia experimentado tal momento. Justamente eu que via o mundo como um poeta alheio a tudo. Justamente eu que havia me tornado um dissecador de doutrinas, um analítico crítico das coisas! Estava me olhando com os olhos de um espectador!
Vi como minha vida passou intermitente, vi como meus braços estavam frágeis, como meu pulmão respirava ofegante, como eu havia engordado! Como os anos haviam escrito suas marcas na minha fronte e como os exageros havia deixado suas marcas na minha barriga.
Quem dera eu pudesse me dispersar. Queria correr de mim mesmo. Nunca antes havia me preparado para esse encontro! Travei uma conversa infrutífera, e percebi que era inútil discutir comigo.
Minhas opiniões mudavam, minha vida mudava, minha história mudava! Finalmente eu havia conseguido me encontrar, mas não dentro de mim. Encontrei-me nas coisas pelas quais eu passava, nas experiências que eu vivia, no amor que me brindou.
Foi quando pude ouvir minha voz! Apenas ouvi-la. Não quis discutir ao mesmo tempo, não quis discordar, dialogar ou combater. Minhas palavras eram suaves e minha voz estava calma, buscava me tranquilizar em meio a tudo aquilo que me horrorizava. E pela primeira vez me ouvi claramente:

"Deixe de sentir dentro da sua alma sua vida esquecida,
A verdade é que existe uma vontade que esta morte desafia
A vontade de um amor infinito, a força dessa vida
Que não pergunta mais o que é a eternidade
Pois vive a eternidade em cada coisa sentida

Quando sentir que a segura em seus dedos
Guarde a tarde dos beijos, leve consigo a força
Que dissipa numa forca todos os seus medos
Então reconhecerás, a força da vida que traz contida,
Não deixe ir embora mais, não deixe a tarde sem você

É tão ruim a despedida quando o sol já vai nascer.
Ainda dentro das prisões da nossa covardia
Ainda no fundo do hospital, nessa nova doença chamada amor
Existe uma força que te guarda e que reconhecerás
É a força mais teimosa que existe em nós que sonha e não se entrega!

Cuide dela, pois ela é a vontade, mais frágil e infinita,
É a cena perfeita de um teatro que não fechará jamais
Que não pergunta mais, o que é a eternidade
Mas que luta todos os dias, até não ter fim,
E provar que o pra sempre nunca mais acabará"


quarta-feira, 13 de outubro de 2010

UMA REAL


As 3 senhoras estão sentadas à beira do caminhos. Sobre suas pernas cansadas as cartas tentam encontrar alguma ordem para dar vigor ao dia. Pés de guaraná se elevam acima das suas cabeças. As árvores já estão com o tronco cansado, e do seu fruto pouco se pode ver. A seiva bruta e a seiva elaborada estacionaram suas atividades faz um longo tempo.
Uma das senhoras, a banhada pela noite, veste-se de verdejantes pastos, verdejantes arbustos. Ela nomeia a si como se nomeasse a mim, só que de uma maneira diferente. Amarra suas tranças e procura a torre de um castelo para desbancar Rapunzel que já está cansada pelos anos de histórias em quadrinhos e lendas da imaginação. O que uma vez lhe foi tirado, agora lhe é devolvido com os devidos juros de um ano bom.
Na outra extremidade, a pele alva se mistura com a roupa, o que nos dá uma noção de brancura e frescor da manhã. Até pouco tempo ainda mostrava os montes que lhe garantiram uma entrada franca na família. Mania típica das ninfas ou musas, ou talvez as duas que alucinaram o Olimpo. Em especial uma, aquela que escreveu seu nome com o metal fino das espadas dos guerrilheiros.
Ainda à beira do caminho a terceira senhora. Ela se veste com amoras, se banha com os morangos e cerejas que cravam fundo a sua pele. imprimem o tom que sonda seu corpo até as extremidades dos seus dedos. Suas mãos seguram firme as cartas que não são de amor, mas podem lhe garantir uma vitória no findar da noite. Sobre ela despejei especial apreço. Sem preço perco meus pensamentos quando prostrado me ponho a admirá-la.
Elas riem, elas conversam, e um turbilhão de assuntos ganham a mesa e se misturam com os dois, três, reis e rainhas, jovens Valetes que gostariam de tomar corpo e vida para experimentar a sensação de por elas serem tocados.
Junto com as cores que a mesa trás se estendem as formas que ganham vida através de árvores, espadas, fino metal e aquele que melhor representa nossas vidas: O coração.
Para cada cada uma delas poderia dar uma carta de presente. Para a primeira senhora, aquela noite vestida com arbustos, poderíamos entregar a árvore, pois em seus olhos vejo a vontade de subir cada vez mais alto nos seus sonhos para poder admirar o mundo que para ela se desenrola como um pergaminho.
Para a segunda, a de pele alva, poderia entregar a espada dos reis e números. A espada que por ela já é usada para cortar aqueles que se aproximam, e mal intencionados atrapalham seu caminho. Como guerreira destemida ela busca provar que é muito mais do que diz, pensa ou age.
E para a terceira. Para a terceira eu poderia dar o mundo, mas sobra para ela a copa. A copa dos corações, a copa alta do mundo que é só meu, só nosso. Para a terceira todos os corações não poderiam conter o sentimento que guardo apenas no meu, e sei que no seu também. Mas como se tratando do mesmo sentimento, temos também o mesmo coração. Coração esse, que os deuses separaram em dois corpos para que nossa busca um dia fosse completa.
E para mim? Ora, para esse admirador dos jogos formados restou o ouro. A riqueza que se torna real pela descoberta do amor. A Riqueza que de tão rica se fez pobre para poder se entregar.
Seria o ouro ouro se sozinho estivesse? Certamente que não. Mas com as árvores e espadas amigas posso me sentir protegido para guardar o coração daquela que fez do ferro o ouro fino e pronto para amar.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

BOA NOITE!


Levanto meus olhos para o infinito e olho para dentro de mim enquanto você dorme. Passeia pelo mundo das virtudes, colhe o fruto das ideias, realiza o impossível nesse quadro multicor.

O vento que refresca seus sonhos, brinda minha noite como a brisa divertida de uma tarde num parque de diversões. Rodo pelo carrossel, busco as nuvens de algodão doce na roda gigante, e percebo que a vista é verdadeiramente linda.

O espetáculo do seus sonhos só é revelado a você, mas eu imagino como seria bom estar passeando pelo seu coração. Olho pra você e vejo meu rosto dormindo. Aflito busco seu ar sereno e encontro na sua respiração o meu abrigo, enquanto seus olhos fechados, buscam o sossego para um corpo cansado.

Sondo meus pensamentos e não encontro nenhum lugar dentro de mim que você não esteja. Como a água que preenche a areia você preencheu minhas lacunas. Você aceitou o convite para participar da minha vida e partilhar das minhas inquietações como se fossem suas. Roubou meus problemas e resolveu minhas equações. Tornou-se o resultado exato, a cicatriz que após a cirurgia torna salva a operação. Ainda ouço sua voz ecoar pelos vales das minhas indagações. Quisera eu ser mais que um corpo apenas, e entregar-me à totalidade da vida.

Queria respirar em cada criatura viva,

queria ver por cada estrela brilhante,

permanecer com os ouvidos sempre abertos como as rochas milenares que compõem as entranhas da terra.

As vezes sinto que o sorriso foge como Dafne correndo de Apolo. A cilada da saudade arma suas esperas e pacientemente prepara o bote da serpente.

As vezes entendo que a felicidade diz adeus, como Píramo se despediu de Tisbe. Só então percebo, que nos caminhos mitológicos passeia o amor, e na realidade da vida nunca poderemos entendê-lo. Como as amoras vermelhas com o gosto branco dos momentos pregressos.

Desisti de entender a vida, quando conclui que sou o único responsável pela minha felicidade. Matei os medos, assaltei os temores, e lhes roubei a capacidade de me atingir.

Matei tudo aquilo que me fazia mal, e com o sangue desperdiçado nas horas de angústia eu fiz grandes esculturas, que com sua sombra permitem a minha diversão.

No Chile, mineiros soterrados me fizeram perceber quão boa é a luz do sol. No Chile mineiros vivem sob a terra me disseram sem saber, que pisar sobre ela é muito bom. Os sonhos daqueles homens presos se resumiu em voltar pra superfície, e agora pensando bem, eu agradeço por estar nela.

Procurando a felicidade nas coisas grandes da vida, desprezei as minúsculas sensações que, somadas formam a grande esperança de satisfação.

Sorrio sem pensar, deixo os lábios relaxados para não chorar. Aprendi a fazer das lágrimas combustível para continuar vivendo, e hoje percebo que tentando me acalmar eu estava morrendo.

Você dorme! Dentro de você um mundo de sonhos, lá fora, um mundo recluso. Pelas ruas alguns poucos ainda caminham, e aqui dentro escrevo essa mensagem para você! Assoprarei nos seus ouvidos essas letras de amor, e mesmo que não possa estar do seu lado, continuarei lhe encontrando num sonho roubado.

sábado, 4 de setembro de 2010

domingo, 29 de agosto de 2010

sábado, 28 de agosto de 2010

domingo, 25 de julho de 2010

Vejam e SIGAM por favor!!!


http://www.youtube.com/watch?v=FZEXjWwauw0

sábado, 24 de julho de 2010

VEM CÁ


Abraça-la foi mais forte que a intesidade da sensação, contabilizada pela mesma sensação que entorpece todo o espaço dos meus sentidos. Foi como encontrar um refúgio seguro, foi como voar nas asas da imaginação. Vê-la deitada nos lençóis da magia, foi tão bom quanto entender os segredos das ondas e partículas que você me ensinou. A física perdeu a lógica própria do entendimento quando os sonhos falaram mais alto do que a razão. Ah, essa razão desenfreada, desgovernada, batia no peito em cada tentativa frustrada de fugir desse mundo. Agora essa mesma razão se submete ao desentendimento do que se passa comigo. Li o sabor dos seus beijos nos textos escondidos da sua boca. Descobri o sabor do seu corpo no paladar disperso da própria roupa. Quis envolvê-la, quis despertá-la. Na madrugada escondida atrás das cortinas, quis conversar, apenas para que os meus olhos pudessem ver seu corpo alegre, suas mãos pequenas, sua alma cheia de charme. Seu olhar me disse o que sua boca esconde. Entendo pelo seu toque a mensagem tornada oculta. Respiro fundo, respiro alto. Trago um corpo apenas, levo dois corpos de assalto. Olhar para você é receber como presente a imagem daquilo que me faz bem. Uma realidade que se escreve na imaginação. Uma noite que passa, uma manhã que termina, uma tarde que se despede, uma noite que alucina. Você é a loucura mais racional que já experimentei em toda a minha vida.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

CALO A BOCA


Sinais de uma noite entregue aos sonhos esquecidos. Perturbações do sono. Corpo rolando sobre a arena das cobertas e rendendo-se aos castigos dos lençóis. Será que o mundo gira em torno da mesma causa, solto pela eternidade das repetições? A vida seria muito mesquinha se nossos dias fossem apenas uma reprodução daquilo que já abominamos em algum instante. E quem disse que a vida não é mesquinha, egoísta e destrutiva? Sinto vontade de ouvir minha música favorita, que tantas vezes já citei nesse espaço. Sinto vontade de interpretar as ondas da canção que não cabem na explicação de uma vida. Quero encontrar o meu EU perdido. Quero me encontrar para poder me abraçar e sentir que o entendimento das frases, mesmo que incompreendidas pode desfazer qualquer rancor. Quero chorar sem a causa triste, quero soletrar o nome das minhas necessidades e desvendar a inquietude das minhas desavenças. Despeço-me do sorriso de uma forma tão contínua que sou obrigado a acreditar que ele nunca existiu de verdade. Parece um anseio tão distante, uma rota tão frustrante que eu chego a imaginar que sua existência é um mero descaso com a verdadeira realidade. Tento hoje na simplicidade das palavras, jogadas no texto de forma descuidada, entender a ausência do bem estar e a clemência que faço para me agradar do mundo. Não consigo caber dentro dessas histórias cotidianas. Não consigo caber nesse mundo. Minha cabeça explode em cada verso jogado num texto qualquer. Não estou estressado, não estou mal humorado. Essa seja talvez a minha forma de acordar para o mundo. Essa talvez, seja a transição necessária para dizer BOM DIA! Não entendo como seria possível alguém se despedir do mundo de sonhos e descanso (presente quando dormimos), acordar para esse mundo de verdades inconsequentes, e manter a alegria que os anjos lhe davam enquanto com olhos fechados sentia aconchegante as horas da madrugada passando por seu corpo, como um vento suave brinda a face numa bela caminhada matutina. Não quero dar bom dia, não quero ninguém saiba como estou. Isso não é para a vida e sim para os primeiros segundos, talvez minutos do despertar. Estou bem. Apenas deixem o tempo ser assimilado pela minha razão. Vejo a manhã como o final de uma história perfeita que podia ser controlada por mim. Ao despertar para as a horas incertas das possibilidades apenas cogitadas, sou obrigado a desvendar toda a simpatia oculta em ideias que ainda estão em formação. Isso é angustiante para quem quer respaldar sua essência nas letras bem contadas de uma vida. Viagens repetidas, estações outrora visitadas. Talvez a solução seja o encontro de mim mesmo em cada sensação espalhada pela minha memória. Talvez eu esteja fugindo de mim por não querer me encontrar. Os sonhos não existem e os heróis morrem todas as vezes que eu desligo a TV. As músicas duram apenas o espaço de uma faixa do cd. Os sons permanecem na minha pele apenas para me oferecer um alívio imediato, mas ineficiente. Corro agora na certeza de que as marcas que sondam minha história são mais reais do que as cicatrizes que elas deixaram.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

TWITTER


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sábado, 17 de julho de 2010

DEIXA


Não sou a voz da solidão solta num campo aberto. Não sou as trombetas mudas e perdidas do coro incerto. Senti a vivacidade do abraço terno quando me senti vivo. Senti o valor de um sangue eterno quando meus braços se ergueram outra vez. Eu disse para mim: Levanta-te!
Parei de condenar a lenha que não queria queimar, quando percebi que era eu que não estava colocando o fogo no seu devido lugar. Enriqueci minha prataria com talheres de ouro e então, fiz um banquete com o prato que todos achavam tolo.
Assim pude sentir mais uma vez o vento suave de uma simples manhã que se prolonga num dia cheio de fatos que esperam um sentido. Eu sou quem dá esse sentido ao meu entardecer, e a noite resgata as lembranças da minha criatividade durante os dias da vida.
Crio meu plano dentro dessas coisas bonitas que o tempo nos dá. Não há força alguma perdida no espaço que prepare pra mim meu futuro, ou amarre os cordões do meu cadarço. Sou eu o responsável por tudo que há ao meu redor. Responderei pelos sorrisos, pelas lágrimas, pelos textos heréticos e pelo suor.
Desisti de tirar minha vida, quando descobri que você fazia parte de mim. Matando-me eu mataria você também, porque você está em mim e eu estou em você! E isso nem a mais simples brincadeira imaginária poderia suportar. Respiro um ar que você me ensinou a aspirar. Arrumo minhas ideias como você me ajudou a organizar. Quando faço nova uma mancha no quintal, você me presenteia com roupas tiradas do nosso varal.
Não me preocupo com mistérios, pois você é um enigma constante que eu sem saber sempre tentei resolver. São peças mágicas, já fundadas na magnitude do que poderiam ser. São portas abertas de uma viagem certa daquilo que hoje talvez não saberia explicar.
Entender a dimensão das atitudes é mister para abrigar a compreensão dos dias e das horas ministradas em companhia. Adicionar ao véu da corredeira uma cascata cheia, talvez não demonstre tanta maestria, mas perceber em gata gota minúscula um lago de possibilidades, é abrir os olhos para as novidades sem as quais não viveria.
Deixa meu sorriso voar solto pelo ar, deixa o menino bobo criar asas para salvar. Deixa a música sem razão ecoar pela sala. Deixa eu falar durante a madrugada, justamente quando o mundo inteiro se cala. Deixa eu mostrar o valar de um sentimento, deixa eu mostrar aquilo que os homens buscam desde o seu nascimento.
Deixa eu colher as uvas que as safras presenteiam, pisar nos campos enriquecidos pelas letras poéticas que me norteiam. Abrir as caixas de presentes e doces de um verão. Imaginar um mundo construído apenas com os sabores e cores da imaginação.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

MEUS SONHOS DE MENINO


Reuni a vontade que rondava meu corpo e a expressei em versos tão absurdamente loucos, quem nem sóbrio mais, eu conseguia parecer. Abotoei a camisa, fechei o terno, prendi a cinta na minha calça larga e preparei a comida do amanhecer. Fiz do muro meu universo, pintei estrelas nas paredes que separam a rua do meu quintal e assim trouxe o céu para perto de mim. Brinquei nesse infinito, deslizei pelas bolhas de sabão e lavei toda a morada dos versos, motivos da minha ocasião. Gritei chamando anjos para o meu socorro e imaginei suas mãos acalmando meu espírito. Subi sobre suas asas que me chamavam de filho, encontrando sob seus cuidados minha proteção. Fazendo isso me tornei um morador celestial e um abençoado rebento, suavizado pelo alento do tom divinal. Colhi cada semente que não desejei plantar antes que elas virassem árvores com sombras que eu não gostaria de partilhar. Não fui o único jardineiro do meu pomar, não fui o único a desejar flores para o meu sonho de voar. Rosas que plantei e frutas que colhi foram as letras santas da vida que verti. Fiz do veneno o deleite da minha refeição e pude experimentar tudo que me faz mal antes da ceia, onde as crianças foram chamadas também. Experimentei dos versos destinados ao mal presságio e numa escura e monótona sensação, senti a dor recebendo adágio. Minha garganta emudeceu como num pesadelo do qual não consigo me livrar. Tornou-se aflita pelo desejo de falar, pelo desejo de fazer soar em suas pregas vocais os acordes que ecoariam pelo mundo como discursos sideirais. O brilho da minha boca absorveu a matéria sem luz e abocanhou um buraco negro que mandou eu me calar. Justamente eu, forasteiro desregrado no mundo da ordem! Eu, voz rouca no coro da orquestra filarmônica. Eu teria de me calar! Não aceito os convites feitos de forma tão despreparada. Não concordo com as ordens dadas numa regra em que a própria ordem é desordenada. Não aceito! Não me calo! Por mais que as vogais tenham se tornado raridade nos meus pensamentos, por mais que as consoantes tenham firmado outro juramento, eu não me calarei. Preciso escrever, porque é na batida certeira do meu peito que faço linhas e acertos. É na batida dos meus sentimentos que busco a fonte ilimitada da fuga para alçar a magnitude das expressões poéticas. Em cada verso traduzo as linhas do meu sentimento, em cada rima desvendo ironicamente o meu desentendimento. Não busco a estética, por considerá-la anestesiada. Descarto as regras por considerá-las maquiadas demais para o que eu quero dizer. Quero mostrar a pele crua ao entardecer, quero mostrar a ideia nua, arrumada apenas para o que eu quero ser. Cavaleiro dos cometas que reluzem pelo universo sem um caminho certo. Escudeiro dos asteróides que caem sorrateiramente explodindo a imaginação daqueles que acreditam nas estrelas cadentes. Quero cortar o corpo, para que o sangue seja visto como o combustível dos meus sonhos. Quero que o vermelho latente e vivo inunde cada espaço secreto do meu vazio. Quero transformar as letras no vestígio mais perene da minha opulência espiritual, escrevendo as regras da censura que reinarão com ternura no meu testamento habitual. Assim me farei entender para a folha das infinitas possibilidades. Assim me tornarei vivo quando meu corpo for entregue ao jardim da saudade. Somente assim saberei que apesar de não ser entendido, fui lido e refletido, só assim me entregarei para o túmulo jaz vencido.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

PÃO MOLHADO


As nuvens choram despreparadas. Lágrimas vertidas que concentram toda a história que seus olhos nunca puderam ver, mas que seu tato pode perceber pelo aumento insano da temperatura. A água escorre ansiosa para despertar a terra sedenta. As bocas se abrem tentando não parecerem ciumentas. As gargantas se preparam para lubrificar seu caminho, e os porões seguem certos de que nunca mais ficarão sozinhos. No labirinto dos sonhos venerados, acordado eu nunca sonhei. Criança que corria as madrugadas, aguardava um instante qualquer para o sol bater. Tocar a campanhia com seus raios iluminados, e permitir que eu buscasse meus brinquedos já guardados. Hoje entretanto, espero aflito a chuva que lavará aquilo que um dia eu chamei de lei. Meu sono é inquietante. Minhas madrugadas são perturbadoras. Não tenho uma noite certa e enquanto todos passam frio, eu vendi na feira a minha coberta. Meu cérebro brinda turbulento mais um momento de viajar. Deitar é sempre um começo para quem não consegue sonhar. Alcanço limites estelares, ultrapasso barreiras racionais e deposito todos meus devaneios no alto das montanhas mágicas feitas de doces dos antigos carnavais. Assim crio meu universo de saudade! Quantos vultos vagueiam pelas sombras dos meus pensamentos? Queria encerrá-los na cadeia, queria tornar-me menos aflito. Queria a simplicidade do mundo, mas do mundo vivo e não do meu mundo restrito! Uma mão desconhecida aperta meu peito, chega ao coração e concede-lhe um novo tempo de batida. Essa mão esmaga minha tranquilidade, faz despertar minha antiga idade e determina quanto tempo eu poderei viver. Contando os choques do meu peito tento entender direito qual será minha promoção. A chuva continua a verter dos céus. Rachaduras na parede do infinito ameaçam o dia ensolarado que deixou de existir aflito. Céu molhado, céu aberto, céu escancarado. O barulho da música foi superado pelas gotas em queda livre. Como pilotos suicidas, elas se preciptaram sobre nossas cabeças, como vozes intrusas elas se assustaram quando perceberam a força do meu calibre. Disparei contra o peito aberto. Joguei areia na cidade e a tornei um grande deserto. Enchi meus baldes com água salgada e tentei construir os castelos errantes dessa jornada. Para o meu desespero, a brincadeira acabou. Não posso construir castelos com baldes, não posso abandonar o mundo pelas minhas mãos, não posso fazer deserto sem alarde, não posso ser pontual sem saber que horas são. O destemido cancioneiro das serenatas absurdas, entrega-se ao violeiro tolo, roubando seu alaúde. Descarta a poesia que sucumbiu diante da banalidade do sentimento, despreza o inquietante, o contraditório e o movimento. Enterra a filosofia que nunca soube entender, encara um novo abrigo, despertanto a vida para viver. Se ninguém vem comigo eu posso perceber, que faltou apenas um antigo para o futuro aparecer. Vivo agora o tempo sem demora, vivo o presente magnífico desse sol. Não é com a chuva que eu sei que o homem chora, não será chupando uvas que eu verei o meu atol.

domingo, 11 de julho de 2010

TUDO É O MEU COMEÇO


Com as mãos atadas num tronco aguardo a fogueira da inquisição. Corpo nu de pelos e adornos, pés juntos e contidos querem fugir de mim.
Olhos vigilantes procuram nas entranhas ocultas do meu corpo um sinal de pecado. O espírito se faz iluminado pelos traços da consagração.
Consagro meu espírito aos prazeres que ele ousou experimentar. Devolvo para seu coro cada grão de areia, cada gota alheia que salga a água do mar.
A vila toda aguarda o momento em que as chamas ganharão o céu e a fumaça levará para o infinito a mensagem de que a justiça se cumpriu. O juiz guardará seu apetrechos, os pescadores voltarão para o rio.
O povo sairá contente e os padres celebrarão a missa. Buscarão crianças pobres, porque de falsos nobres a vontade já sumiu.
Tolos e tolas sentados nas suas próprias inquietações, agradecem as potestades e aos querubins, principados e serafins, mais uma chance concedida pelo Senhor para poderem esconder suas malícias e transbordarem o ar da pureza celestial. Eles verão a morte sem a morte lhes acariciar. Eles mostrarão aos fortes sua força estúpida e tola, envolta num presente promíscuo, casas de doces para brincar. Em cada brincadeira escondida, uma nova alma perdida perde seus dedos para contar.
Corpos vivos tropeçam nos cadáveres em decomposição. O cheiro podre da conspiração supera o odor do enxofre vindo do inferno que aproveita as fendas da terra para aparecer, brindar os convivas e depois saborear seu banquete, lambendo os dedos e deixando evidente toda vontade que tinha de comer.
O Diabo na sua forma mais aguçada de vilão, transita saltitante e esvoaçante, por entre os brados certos da condenação. Ele incita as palavras de ordem, conduz o julgamento, dispara a desordem. Que venha o metal quente e que o fogo consuma até as brasas, escondedo as frases que hoje viraram carvão.
Cães famintos sentam-se à mesa. Abanam o rabo esperando pelo pedaço de corpo que será lançado para eles nas profundezas. Seus latidos não são um coro angelical. São a segurança dos portões do submundo que guarda o segredo profundo de um inferno em decadência astral.
Fervilha o caldeirão com sua própria ebulição convidativa. Seu cheiro de resquícios saborosos torna a lembrança um lugar ativo. Transforma o corpo no seu próprio escândalo que desprende do sândalo seu escárnio destrutivo.
Nessa cena onde até mesmo a mais densa escuridão assusuta, não me assustaria se minha mente astuta estivesse a gargalhar. Rio diante da possibilidade temida de sobreviver. Morrer é silenciar o mundo das nossas tristezas. Viver é avisar ao mundo que no céu não tem beleza.
Carrego a condenação de viver a vida até o fim. Carrego a inquietação de não poder saber quem fugiu de mim. Em vales indigestos de ganância tola percebo que o nefasto é um dia quente brindado por uma tarde de garoa. A chuva trouxe numa contagem contínua, o brinde esguio de uma festa de menina. A chuva encheu meus lábios, preencheu minha boca e fez a minha garganta sentir o gosto da água pura mais uma vez. Que venha a fogueira, que ela faça arder o eu em mim. Não se faz rio sem corredeira, não existe começo sem antes partir de um fim.

quarta-feira, 24 de março de 2010

A ALMA GRITA


Um silêncio tardio interrompido apenas pelas caldalosas correntes de sangue que seguem seu destino pela marginal tortuosa da esperança morta.
Carcaças apodrecendo aguardam o retorno das almas, que agonizantes recebem a notícia da condenação eterna.
O corpo se contorce. Cada centímetro daquele esconderijo tenta gritar. Lágrimas cútaneas molham a pele, e por cada fenda aberta brota um pouco da minha angústia. Queria que os cães me devorassem.
Minha cabeça explode! Raios de estupidez estouram a minha consciência. Uma chuva de lampejos falsos ilumina temporariamente minha residência. Suas luzes se perderam quando o temporal dos ventos fortes passou pela minha vida e desmoronou todas as paredes.
Minhas ideias se tornaram reféns da mórbida inquisição que impus como via de regra. Os anos que contabilizei num livro profano foram reforçados pelo calor do inferno que ardia.
Dentro de um enigma palpitante do desconhecido, guardei uma caixa fechada de mistérios. Pude ter certeza de que não seria surpresa se eu me perdesse dentro de mim. Eu me perdi e tentei não me achar. Fiz um labirinto com minhas dúvidas e completei meu cardápio de loucuras com perguntas que nunca quiseram questionar. Perdi a vontade de escrever. Meu bolso furado deixou cair palavras, perdeu letras e desperdiçou sentidos. Fiz um chá amargo com o doce que um dia já derreteu em minha boca.
Minhas decisões foram os gatilhos de um pelotão de fuzilamento. Soldados sedentos por sangue fresco. Algozes repletos de apetite, prontos para devorar mais um cadáver.
Meu peito foi o alvo discreto de uma carnificina lenta e cirúrgica. Tiros e depois cortes precisos, souberam exatamente como tirar cada pedaço de vida. Não pude condenar as montanhas, mas foi exatamente quando suas geleiras despencaram, que a avalanche cobriu meu semblante.
Enterrado numa cova rasa, exalando odores de cadáver fresco, vendo flores brotar do meu ventre, e com os olhos cheios de terra eu tentei dormir. Meus sonhos dividiam o espaço da minha mente, e repartiram entre si a realidade e a imaginação.
Não ouvi o relógio, que berrando, tentava me acordar. Cavei fundo o espaço dos meus pesadelos. Sem perceber, eles invadiram meus sentidos e provaram que eu ainda sentiria dor.
Ela não tardou em sua missão. Veio forte, intensa, desconhecida. As mãos das bruxas bandoleiras apertaram meu peito. Suas unhas perfuraram minha barriga e escreveram no meu estômago a sentença da condenação.
Tentar morrer, essa era a ideia que rondava cada aspecto soturno do meu enredo tétrico. Tentar morrer, uma atitude profana que encerraria numa cama o desfecho trágico de uma comédia épica.
Não consigo mais reagir a dor. Maldita seja a oferta de esperança que um dia me fez acreditar que era possível continuar a viver. Quero que essa vida vá à merda. Quero que ela se ajoelhe diante da morte imponente e peça perdão por um dia ter ousado imaginar que poderia para sempre viver. Pago meus pecados.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

MINHAS HISTÓRIAS


Teatro sombrio com cortinas rasgadas. Cartazes abandonados em docas que há muito tempo não sabem o que é um navio. Estivadores bêbados e largados nas valetas que antes foram seus esconderijos. Morcegos que voam sob a lua, e assistem aos sonhadores que torcem pela visita de um vampiro. O tempo da colheita já passou, e a árvore que trazia os sorrisos largados hoje tem pendurada cabeças que não sabem o que é alegria. Muitas cabeças pendem dos galhos que queimaram na fogueira do último ato. Estão amarradas pelos cabelos e balançam no som exato das notas que o vento traz na forma de assovios. Ao lado do bosque de crânios, um lago de lágrimas que sem sentimentalismo algum, ganhou sua dimensão com o choro frio das viúvas dos astros assassinos. Uma planície coberta por corpos decepados encerra a cena tétrica da peça concluída. As luzes refletiram bocas sem dente e o olhos que brilhavam, assim o faziam pelo fogo que ardia dentro das suas retinas vazias. Foram vazados pelas cenas que insistiam em acontecer. Hoje guardam apenas o imagem negativa do último acontecimento. Uma fotografia que não virou retrato. O sorriso disse adeus e levou consigo o que havia de melhor. Escolheu a dedo suas opções e priorizou o lamento solto das tardes eternas. As bocas geladas assopraram as últimas tentativas de aquecer uma novidade que não teve palmas e nem festejo, apenas lamentos, lamúriase velórios de lampejo. Num campo onde o sol não quis brilhar, foram feitas as escolhas erradas que trouxeram para a igreja um demônio que precisava ser exorcizado. Os espíritos saíram, os espíritos vibraram. Perguntaram quais os corpos deveriam ser recolhidos, e a tentação lhes disse que nenhum. Todos deveriam apodrecer, todos deveriam perecer. A condenação dos seus dias veio pelo fato deles não saberem como recordar. De eles não darem atenção aqueles que lhe pediam. Um minuto de inteira atenção, era tudo que se cobrava. Mas a alma estava presa nas próprias inquietações absurdas, e tratou como opção o coração que lhe tratava como prioridade. Ao juiz coube a sentença. O fim do primeiro ato se deu com a morte do culpado. Um único tiro que lhe perfurou a fronte e fez com que sua cabeça estourasse no quarto fechado. Em câmera lenta era possível observar as lascas dos ossos que saiam da sua cabeça, a parede sendo manchada com a despedida da vida, e o chão inundado pelo que antes corria em veias e artérias. Estava guardada na eternidade a esperança de voltar a ser feliz. Morrendo, sabia que não poderia ter paz, mas sabia também que jamais sentiria as lágrimas rolarem pela sua face outra vez. O diretor divulgou a peça, os atores ficaram estupefatos, a platéia não entendeu o desfecho, e a donzela das antigas histórias sentou-se no chão e sorriu. Gargalhando escrevia o próximo ato. Gargalhando demonstrava as aclamações por uma nova vida. Podia não ser a risada mais sincera, mas era a certeza de que jamais sofreria novamente.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

MEU INFERNO VIZINHO




Sagrei-me cavaleiro nos portões infernais. Troquei meus pés por cascos dispostos a cavalgar as planícies da maldição. Maldito, Maldito, Maldito. Tornei-me arauto das batalhas diabólicas, e nas fendas amaldiçoadas ergui meu estandarte da perdição. Ergui o escudo feito com os ossos daqueles que ceifei, e enquanto usava minha proteção, ouvia o clamor daqueles que, sem piedade, fiz questão de abandonar. Famintos doutores do banquete de lixo e das fezes ditas relíquias.


Conversei com almas desossadas, e coloquei os mortos suculentos sobre a mesa para que finalmente eu pudesse saborear uma distinta refeição. Um pouco de água sobre o cadáver, a ferramenta certa, o corte preciso, e eis um belo jantar. Pena que a comida estava um pouco fria!Tudo bem, esses mesmos corpos quando chegarem ao reino subterrâneo das trevas estarão aquecidos pelo fogo que consome milhões. Trevas apenas no nome do distante domínio, uma vez que a luz e o calor estão presentes de forma constante. Tudo queima sob o olhar atento do demônio em excitação.


As labaredas da pira eterna do inferno souberam gravar na minha pele as marcas que o metal deixou no meu coração. Sentei num canto qualquer, e com a faca usada para tirar a vida, gravei o nome das penitências que ainda terei de cumprir. Encostei suavemente sua ponta em minha carne, até cravar o aço nos meus ossos, e a suavidade dar espaço a agressão que assumiu agora o controle. O sangue verteu, escorreu pelo meu braço e brindou o chão com o seu aroma inconfundível e com sua vontade de voltar para o universo tentando outra vez experimentar a vida.


Rumei para o reino dos mortos degradados e fui recepcionado por demônios fedendo enxofre. O chicote escreveu com o sangue das minhas costas o caminho para o cálice sagrado. E de líquido vermelho saído do corpo em feridas se fez o jantar. Bebi minha própria vida, bebi meu próprio eu. Vomitei a vontade partida, vomitei demônios em forma de deus.


A perdição estava impressa em cada lareira acesa para esquentar uma caldeira. A lenha estourava, a madeira era consumida pelo calor. Dentro da mesma caldeira, corpos ardiam entoando as músicas satânicas que trouxeram a condenação. O Diabo não cantava mais. Ele era o motivo da canção. Feliz, via os corpos derretendo. A pele pendendo dos ossos e pingando no chão. Todos deformados, apresentavam faces em decomposição. O cheiro podre infestava o lugar.


Olhos vermelhos cravejados de diamantes davam o brilho que a festa pedia para ter. Dentro de cada corpo borbulhando, uma alma sonora tentava resgatar um pouco da bondade abandonada nos anos que passaram. Não conseguia, e a cada tentativa frustrada, voltava ávida por um crânio estourado para compensar o esforço vão.


Nada se diz ali. O que se houve são prantos, palavrões, gritos, dor. A própria dor encerra sua jornada após um tempo de trabalho e abandona o corpo que se vê rejeitado até por essa estranha forma de sentir. É o mais baixo estado de um corpo que flutua na própria sorte.


O inferno se abriu pra mim, o inferno me engoliu. Não consegui respirar o último instante das verdades ditas e caí nas chamas do engano, que ardem as mentiras queimadas, e reciclam cada gesto tido por enganoso. Fogo das aberrações condenadas. Velas que derretem sua cera e marcam meu corpo com aquela calda quente, tatuando um caminho sem fim e sem retorno.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

O DESENCONTRO COM A VIDA


Sonhei que morria lentamente. Despedia-me da saudade para respirar sem o peso da mágoa da despedida. Percebi quando o ar deixou de ser prioridade para os meus pulmões, e eles apenas queriam experimentar a substância do próximo passo. Senti a dor lacinante do peito vazio, quando por um instante não consegui absorver a atmosfera que me rodeava. Congelei minha expressão, e deixei nessa hora um anjo me carregar para a sorte tranquila de uma serenidade almejada.

A vida dava adeus para mim que sempre reclamei dela. No curto espaço entre as perguntas e as análises, tentei deixá-la ser um pouco de si mesma. Construí tantas formas que esqueci qual era a minha, e sendo assim não pude provar de mim mesmo por desconhecer o gosto que teria.

Nunca experimentei a essência daquilo que disse. Preguei a felicidade numa cruz e deixei-a sangrar paulatinamente, até o instante em que o coração parou de pulsar. Fiquei deitado com minhas mãos cruzadas, sentindo ainda uma insatisfação constante. Ela rondava o caixão sorrindo, fazendo brilhar seus olhos para mim, e condenando-me ao sofrimento. Sofrer para pagar o sofrimento que impus como regra.

Levantei a cabeça e nada havia para ser visto, exceto minha alma ensanguentada, manchada pelas gotas que eu deixei escorrer enquanto como um louco corria em busca daquilo que até hoje não sei.

A dor lacinante das lágrimas, que avassaladoras percorriam caminhos quilométricos, muito maiores do que uma face, ficaram como um presente para mim. As manchas da água que verteu dos póros desenhava os quadros que eu levaria para o além. Sobraram as gotas da sarcástica alegoria de uma criança infeliz.

Restaram vagas insinuações de uma lua irreal, reluzindo sobre um mar irreal, e o perpassar veloz do cascalho do leito da estrada, que resumia minha vida em pedaços como pedregulhos que saltam da grande rocha. Nada de sólido permaneceu, e na tentativa de um olá sem pretensão, a alma calou-se diante do silêncio de um não. Sob a luz das estrelas apaguei a luz da minha esperança e deitei no berço da velhice precoce.

Deixei escapar a vida entre o vão dos meus dedos, que levados pelas minhas mãos sempre tentaram segurar o mundo, sem perceber que o mundo me segurava. Segurou-me enquanto pôde. Segurou-me até seu peito também não suportar mais.

Vitimado pelas circunstâncias das minhas verdades, defendendo com lealdade os pilares que nunca me defenderiam, morri na sorte árdua de um encontro marcado. Morri para as lembranças que um dia me apagarão também. Morri para o pássaro que construiu seu ninho. Morri antes de virar passarinho.

Senti que nos espaços antes ocupados pelas ideias, sobravam grunhidos que há muito deixaram de ser vozes. Corpos que foram ao inferno, ao purgatório e ao paraíso. Amores que além da vida souberam deixar o tempo passar. Lembranças que resumem essa passagem apenas como uma recordação. Olhos fechados que não mais verei, filmes que deixarão de passar, madrugadas abandonadas pelos sonhos. Quadros que deixarão a parede vazia. Sorriso que não mais saberei encontrar.Pessoas em penitência, sem entender a lealdade da lembrança dirão:

Do poeta esperançoso aqui jaz as letras miúdas de uma experiência falha. Do escritor sonhador, despontam apenas desapontamentos sórdidos guardados à sombra da montanha de lixo que se formou. Nada disse de útil, nada provou de sóbrio. Nas suposições sorrateiras de suas verdades cegas, cavou o abismo da sua morte sem redenção.