sábado, 20 de setembro de 2008

O COPO DOS DEUSES

A bebida amarga foi colocada sobre minha mesa. Dei alguns goles, e de pronto descobri que meu paladar não estava suficientemente preparado. Ainda me recordava dos sabores suaves que experimentei, dos vinhedos ricos, com suas uvas prontas para a saborosa degustação. Que saudades sinto da Enotria, e de seus mares marcados pelo intenso torpor, que subia ao mais alto céu quando celebrado por suas divindades. Não importa se Piemonte com suas espumas e robustez, recebendo o grande Barolo, a lembrança boa dos reis, ou então Toscana alardeada por ser o jardim da Itália, trazendo consigo o Chianti o Brunello e deixando a doce mágoa pela ausência do Sassicaia. O que valia mesmo, eram as tardes ensolaradas, a busca pelos campos floridas na primavera despreocupada. Tudo isso acabou muito rapidamente, e no corpo ainda ausente sinto o levantar da madrugada.
A poesia, que o mundo viu romper cambaleante com os exageros da alma pensante, juntamente com a música que embalou os mais altos sonhos do aventureiro errante, foram os frutos vívidos e marcantes, que restaram de garrafas vazias nas cabeças cheias e sem anestesia. De perfumes e aromas ilustrados é que se tiram as verdadeiras lições que vida ensina. Em cabarés, onde a mesa vazia alucina, entendo para onde foi a fé que estava na cabeça infantil de uma menina.
As garrafas acompanharam os poetas. Sua companhia foi mais forte do que as letras, nas quais o pobre homem se inspirava enquanto escrevia. Os pensamentos soltos foram jogados na maré alta, e o escritor errante percebeu que nenhuma nota lhe falta, quando ao olhar a pilastra principal, observara que ela estava torta, percebera então, que já passou o mal de seus lábios, e bêbado ele exorta. Proclama a dor livre e o engano, proclama o amor e as paixões dos tiranos, numa leve doçura que mais parece um plano, de perpetuar a ternura envolta apenas por um pano. E finalmente a arte de desvendar os segredos completos, tardios em aparecer, torna rouca a voz aberta, e põe os homens a emudecer.

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