terça-feira, 30 de setembro de 2008

Série sanduíche filosófico: MAQUIAVEL NÃO ERA MAQUIAVÉLICO

Nicolau Maquiavel (1469-1527)
O PRÍNCIPE

A Europa Moderna (contexto em questão) era uma conseqüência de uma fragmentação política que havia esfacelado partes do feudalismo. Muitos reinos se encaminhavam para a formação do Estado. Um conceito sociológico definido como sendo uma porção territorial, com povo, soberania, unificação de pesos e medidas, moeda própria, exército regular e governante. Mas o caminho da unidade nem sempre era fácil.Enquanto a maioria das nações européias haviam centralizado o poder, a Alemanha e a Itália ainda estavam divididas (fragmentadas) em muitos Estados, que se envolviam constantemente em disputas internas pelo poder. É nesse contexto que vive Nicolau Maquiavel, na república de Florença. Observa com atenção e interesse a falta de estabilidade política na Itália, que está dividida em principados e repúblicas, onde cada qual possui sua milícia, geralmente formada por mercenários. Dentre os vários contatos valiosos que obteve quando ocupava a 2ª Chancelaria do Governo de Soderini, Maquiavel conheceu César Bórgia, que estava empenhado na ampliação dos Estados Pontifícios e, observando a sua maneira de agir, este é considerado por Maquiavel o modelo de príncipe que a Itália precisava para ser unificada.
Escrito em 1513 e dedicado a Lourenço de Médici, O príncipe provocou algumas interpretações controversas. Primeiramente, Maquiavel é um filósofo que defende a centralização de poder na figura de um soberano. Jamais ele defendeu o poder corrompido ou a tirania. O que ele faz é uma releitura da ética, aplicando a finalidade como a clara justificativa para o meio empregado. E qual era essa finalidade? O bem comum do Estado. Então, para chegar ao bem comum desse mesmo Estado, o príncipe está legitimado em suas ações. A transformação da ética ligada aos preceitos positivos, numa ética política, é que causa a maioria das confusões. O poder arbitrário pode ser exercido, desde que em função de uma política coletiva. Nos termos tradicionais, Nicolau Maquiavel não era Maquiavélico!
Interessante perceber também que no capítulo IX de sua obra, Maquiavel veladamente aborda idéias democráticas, quando discorre sobre a necessidade de o governante ter o apoio do povo, sempre melhor que o apoio dos grandes, que podem ser traiçoeiros. O que Maquiavel está abordando, é a idéia de consenso, que posteriormente irá adquirir uma importância gradual. Para caracterizar o príncipe, Maquiavel usa as expressões italianas virtù e fortuna.
Virtù: Força, valor, qualidade de um lutador, guerreiro viril (na aplicação grega do termo). São governantes especiais, capazes de realizar mudanças, grandes obras e alterar o curso natural da história através de suas ações. Não se trata do príncipe virtuoso no sentido de bondade e justiça da moral cristã, mas sim daquele que tem a capacidade de perceber o jogo de forças da política, para então agir com energia a fim de conquistar e manter o poder (sempre lembrando que Maquiavel não apóia a tirania!).
Fortuna: Ocasião, acaso. (não está relacionada ao dinheiro, mas a sorte). Para agir bem, o príncipe não deve deixar escapar a fortuna, isto é, a ocasião oportuna. De nada serve a virtude para o príncipe, se ele não souber ser precavido e ousado, aguardar o momento certo, aproveitar-se do acaso ou da sorte, e principalmente das circunstâncias que o cercam. O príncipe pode e deve moldar as circunstâncias.
Vale lembrar também que Maquiavel se inspira na política da Roma antiga para delinear suas idéias. Roma foi a grande fonte de inspiração para sua obra. Ele admirava a forma de organização e determinação política. Por isso ele apresenta o Poder Absoluto como meio de conduzir o governo e o povo para uma Estabilidade política, e então encaminhar o governo para uma República. Isso contraria o pensamento de muitos que julgam Maquiavel um defensor perpétuo do poder absoluto.
Ética e Política: Ele faz sem dúvida uma reavaliação nas questões éticas até então praticadas, ou pelo menos, ditas praticadas. Defende uma moral laica, secular, de base naturalista, diferente da moral cristã; por outro lado estabelece a autonomia da política, negando a anterioridade das questões morais na avaliação da ação política. A moral cristã fundamenta sua essência em princípios atemporais, existentes antes mesmo de o Homem ou o Estado existirem. São os princípios do Bem e Mal, Justo e Injusto, Certo e Errado. O indivíduo está subordinado ao Estado, mas a ação deste mesmo Estado se acha limitada pela lei natural ou moral, que constitui a instância superior. A nova ética de Maquiavel analisa as ações não mais em função de uma hierarquia de valores dada a priori, mas sim em vista das conseqüências e dos resultados da ação política. Podemos entender como uma nova moral, que está centrada nos critérios da avaliação do que é útil à comunidade: Se o que define moral é o bem da comunidade, constitui dever do príncipe manter-se no poder a qualquer custo, por isso às vezes pode ser legítimo o recurso ao mal, a força Coercitiva do Estado. Mas o príncipe de virtù usa a violência porque é forçado pela necessidade, visando o bem coletivo, diferente do tirano que age por interesses particulares. Para ele então, a avaliação da moral, não deve ser feita antes da ação política, segundo normas gerais e abstratas, mas a partir de uma situação específica e em função do resultado dela.

2 comentários:

Unknown disse...

me escreva!! diariodofauno@gmail.com

Ti4go N4t4n disse...

Valeu ai Professor pela
Série sanduíche filosófico,
fiko bem fera mesmo
flow.