domingo, 20 de julho de 2008

EPUR SI MUOVE

Não me peça para mudar algo que eu não vou conseguir. Nem ao menos reconheço o nobre erro que o júri me atribuiu, quando fui julgado sem saber, e reagi sem querer. Não fui eu quem fiz as leis, não fui eu que busquei encontrar. Cada passo dado para o acerto, é também o primeiro passo para errar. Até tentei apagar as linhas que escrevi num momento em que minha caneta estava solta, e minhas mãos seguravam o vazio. Mas tão logo recuperei o fôlego, voltei a me impressionar com a solidão. Ainda ouço pelo quarto a voz de uma mesma voz, e vejo a mesma visão: meus olhos tentando ir além num espaço que jamais conseguirei entender. Em tempos de paz, a guerra se faz sentir pela ausência. O tormento forte não foi o bastante para me impedir. E mesmo que a chuva levasse em suas corredeiras a expressão viva do meu mar, eu não poderia permitir que o som de sua voz me pedisse para mudar. Os vinhedos estão prontos para prosperar com gotas novas do suave sabor, e meu lamento é saber que à mesa brindam em minha ausência. O verde musgo ganhou as pedras em seus muros que se ergueram para além de Berlim. Dividiram a Alemanha, o Báltico, o mundo, os sonhos e os mares do sem fim. A cordilheira se ergueu e não permitiu que sobreviventes a vencessem outra vez, como se a vitória outrora concedida fosse apenas a ponta da lágrima vertida transformada num iceberg chileno feito de gelo polonês. Eu queria ser aquilo que imaginei. Queria contar com os anos de um universo em planos, e perceber que a cada abraço humano é que sinto a beleza da divina perfeição. Entrar numa órbita occipital e ter acesso ao verdadeiro olhar. Olhar sem preconceito sem vontade de visão. Envolto num abraço perdido na emoção. Nem que para isso eu tivesse que regredir no tempo e inverter os ponteiros que trabalham ao meu favor. Queria na verdade derreter os relógios num fogo abrasador, e permitir que os segundos fossem libertados de seu inferno temporal. Por hora agora digo, que não me fiz homem por engano, e que diante da aflição de uma viagem sem planos prefiro ficar na estação. Mandem notícias quando voltarem...

2 comentários:

Maya disse...

Uau!
Muito bom,Chê!
É de sua autoria?

"Em tempos de paz, a guerra se faz sentir pela ausência."
Adorei!

Professor Che disse...

Obrigado e com certeza. Quando uso outros autores cito a fonte. Valeu mesmo.