quinta-feira, 13 de agosto de 2009

ALGUMA COISA FORTE POR FAVOR.

Quantas estrelas eu posso contar durante a noite? Depende quanto tempo eu queira passar olhando o céu. A vista perde a noção de quantidade, e quando menos se espera o que se vê não é mais a realidade. Diga adeus ao passo largo da saudade.
Essa tormenta que não passa deixa no rosto um sorriso sem graça, e agora penso nas corridas inveteradas pelas ruas, no calabouço da madrugada. Trancando a miséria da fome de comida viva, e fazendo-me perceber o quanto é cedo, e eu ainda nem comecei a experimentar a vida. Em pouco tempo não serei mais quem eu sou. Serei uma ventania expressa nas vidraças embaçadas, soprando o torpor dos buracos profundos que cavei com meus pés.
Procuro a sorte de um copo tranqüilo posto sobre a mesa de uma estação nova, de um verão tropical. Procuro o que sobrou de uma fruta mordida no cesto das expectativas desconcertantes, e mato a sede na saliva de uma boca umedecida por um copo de whiskey, sem gelo, e aquecido pelo calor que sai a todo vapor dos pulmões ofegantes.
Busco algum trocado para o mendigo tombado na vala comum do dia, mas não acho nada além de moedas que foram separadas para o próximo trago.
Uma bela noite de bebedeira e farra, sempre antecede um dia de orações e água mineral. É saúde paga a prestação, contemplada com previsão. A vida sem a experiência do saca rolhas, acaba se tornando uma etapa que apenas precede o sono eterno. Beba para sonhar acordado, e discernir embriagado a diferença entre o barulho de um simples som, do encanto de uma sinfonia quando está atordoado.
Gim, Vodka, Whiskey, Conhaque, uma batida de alguma coisa que não seja coração. A bebida que é apreciada nas vitórias, é necessária nas derrotas. É o néctar oculto atrás da flor da coragem, que inspira o viajante parado, e segura o paradeiro da viagem.
Dê-me um lápis e um papel e eu ganharei o mundo. Dê-me a terra e eu mostrarei o quanto o céu é profundo. Sentirei o perfume de uma flor no lixo, e acharei uma entonação distorcida nas festas da Belle Epoque.
Escrever versos, entoar poesias, declamar as sensações, pensar na intelectualidade complexa do entendimento das coisas que nos deixam absortos em nosso próprio raciocínio, são exercícios que formam seres fechados dentro da capacidade individual de contemplação. Na verdade o que levaremos do mundo senão a própria quietude diante do grito das indagações? São companheiras únicas, exclusivas da nossa própria exclusão.
Quero uma bebida para adentrar as portas da percepção. Quero derreter o mundo e construí-lo outra vez. Não importa se para isso eu tenha que chamar os parceiros etílicos das poesias livres. Tenho medo da noite e medo desses animais. Estão soltos na selva e brincam o tempo todo, fingindo serem bons, mas querem nos devorar. Saltar no pescoço descoberto e fazer verter o sangue vermelho. Escondo-me atrás das letras que eu criei, escrevo frases pelo avesso que eu deixei.
Quero a metade daquilo que inteiro me divide. Uma bebida por favor, para que o mundo se torne interessante. A bebida é a bengala de um velhinho que mora em mim, mas criança escondida, um dia voltará, aí então saberei quem sou.
Se antes o mal estar precedesse a embriaguez, nós evitaríamos beber em excesso. Mas o prazer, para nos enganar, vai a frente, e esconde suas intenções. Quando sóbrio não sei da onde vim e nem para onde vou, quando bêbado tampouco sei onde estou, é apenas mais um lugar para estar perdido. Sigo em meu pedido.
Quero ser um artista na companhia de bêbados, que somem aos seus desejos uma amizade valente, firme no volante que dirige a vida e busca um veneno para matar a monotonia que agride. A vida está nua, a vida presenteia com tapas na cara. Desperta a sintonia fina, torna fútil a palavra que era rara.
A lança do marasmo atacou diretamente os portões da sensação mórbida, estreitada por sentimentos solitários que afagam um animal. Como uma criatura libertada dos seus próprios limites, solta no desconhecido, brado, corro, arranho, grito, transpondo assim o que antes era apenas um gemido.
Tomo um copo, dois, vários copos inteiros. Bebo um corpo, o mesmo corpo, várias vezes o corpo inteiro. Ele corre se escondendo atrás das garrafas, finjo que não vejo só para procurá-lo mais uma vez. Ele se esconde, grita, para, anda, achando assim que no seu esconderijo sóbrio, a mim ele engana. É o meu corpo que estou a perseguir.
As vezes saio de mim. As vezes me persigo sem saber. Quero agarrar meus próprios pés, e fazer caminho de meus passos, e prender suavemente os meus laços. As vezes me encontro só. Seguro com minhas mãos o palpitar das emoções remotas, e me reconheço perdido, buscando o verdadeiro sentido que se encontra oculto nas cisternas rotas.


5 comentários:

Tainara Siqueira disse...

"Quando sóbrio não sei da onde vim e nem para onde vou, quando bêbado tampouco sei onde estou, é apenas mais um lugar para estar perdido. Sigo em meu pedido." Quando bêbado gestos são mais fortes que palavras.

Anônimo disse...

" A bebida que é apreciada nas vitórias, é necessária nas derrotas"

Denise disse...

Curiosamente passando o tempo,passando os anos,vez por outra é preciso um copo cheio de algo forte,para quem sabe embriagar,ou...

trazer a luz.

Unknown disse...

Uma bela noite de bebedeira e farra, sempre antecede um dia de orações e água mineral.Tudo tem as suas consequências.

SACHA LOPES disse...

Dê-me um lápis e um papel e eu ganharei o mundo. Dê-me a terra e eu mostrarei o quanto o céu é profundo. Sentirei o perfume de uma flor no lixo, e acharei uma entonação distorcida nas festas da Belle Epoque.

Obrigada pelos comentários em meu blog.
Não imagina o quanto é importante sua opinião, sinto-me lisongeada.
Abraços